Aquele cineminha da esquina quase não existe mais. O arrasa-quarteirão da moda é o multiplex. Dados do BNDES mostram que os exibidores retomaram a construção de salas de cinema no país, optando pela tendência da adoção do formato multiplex, preferencialmente em shopping centers.
O banco tem pedidos de financiamento em tramitação para 95 novas salas -desse total, 29 ficarão em São Paulo. Até o final do ano passado, o país tinha 2.095 salas. Desde 2004, o total de salas multiplex cresceu 58% e passou de 629 para 996 -atingindo 48% das salas disponíveis.
O conceito de multiplex surgiu há 20 anos nos EUA e chegou ao Brasil no final da década de 90. Segundo o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), ele proporcionou um aumento da receita para os exibidores, tanto pelo crescimento do público como pela oferta de serviços adicionais, que incluem salas de jogos eletrônicos, estacionamento e praças de alimentação.
Esses cinemas passaram a explorar de forma mais rentável a publicidade, exibida nas telas e nas áreas de alimentação. Com menos empregados para manter uma infra-estrutura maior do que a dos cinemas tradicionais, esse modelo também se tornou vantajoso em relação a custos.
Dados da Abraplex (Associação Brasileira das Empresas Exibidoras Cinematográficas Operadoras de Multiplex) mostram que a bilheteria responde por 75% da receita do setor. Itens como lanches e publicidade respondem pelo restante.
O domínio do multiplex nos novos investimentos causa polêmica no setor. Para o produtor Luiz Carlos Barreto, a prioridade de cinemas nesse formato gera uma distorção. “O mercado fica muito concentrado, com grande oferta para as classes média e alta e uma exclusão da população de baixa renda”, aponta.
Na avaliação do dramaturgo e cineasta Domingos de Oliveira, que está lançando o longa-metragem “Carreiras”, o aumento das salas de cinema no país representa uma melhora para o setor.
“O fato de ser multiplex não tem uma importância negativa explícita. São salas de cinema com boa projeção. O problema do setor é mais grave e se refere à legislação que o rege. A infra-estrutura da atividade não funciona”, declara.
O cineasta Cláudio Assis, diretor de “Baixio das Bestas”, vê a expansão das salas multiplex como mais um limitador para a distribuição de filmes nacionais. “O cinema brasileiro está brigando consigo mesmo por espaço. Tem que decidir quem vai lançar seu filme primeiro porque não tem espaço para ninguém. O governo precisa investir em sala popular, no subúrbio, não dá para investir em salas com sessão de cinema a R$ 20”, diz.
Custos
Os pedidos de financiamento ao BNDES para a construção de salas são feitos por meio do Procult, uma linha de financiamento destinada ao setor de economia da cultura. O banco reduziu exigências de garantias e o valor mínimo das operações para R$ 1 milhão nessa linha.
O custo de construção de uma sala multiplex, com poltronas mais confortáveis e ambiente em formato “stadium” (permite visualização adequada em qualquer assento) é da ordem de R$ 1 milhão, projeta o BNDES. Já uma sala de cinema convencional está orçada em cerca de R$ 500 mil.
Segundo Luciane Gorgulho, chefe do Departamento de Economia da Cultura do BNDES, o banco analisa as condições de competitividade do mercado antes de aprovar o financiamento. “Observamos a taxa de ocupação média das outras salas, o preço do ingresso que pode ser praticado e as condições de competitividade do empreendimento”, declara Gorgulho.
A comparação do número de ingressos vendidos entre 2004 e 2006 mostra uma queda de 21%. O cineasta Beto Brant, em cartaz com “Cão sem Dono”, afirma que fazem parte de uma minoria as pessoas que ainda privilegiam as salas de cinema. “As pessoas estão cada vez mais ficando em casa e assistindo a filmes no DVD”, analisa.
A maior parte dos pedidos de financiamento no BNDES vem de grandes empresas do ramo exibidor, que procuram oportunidades de investimento em locais sem tradição de cinema. Quase todos os projetos apresentados ao banco são localizados em shoppings.
É o caso da Cinesystem, rede que atua no Sul e no Sudeste do país. Em outubro, ela inaugura seis salas de cinema no Shopping Bangu, localizado na zona oeste do Rio. A região tem cerca de 600 mil habitantes e apenas um cinema, recém-aberto.
FINANCIAMENTO É MAIS DIFÍCIL NO INTERIOR
Levar o cinema ao público que vive no interior do país ainda é um projeto ousado para os exibidores. Os pedidos de financiamento para novas salas nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro representam 70,5% do total, segundo o BNDES.
A maioria dos pedidos de empréstimo parte dos grandes grupos que controlam a participação de mercado do setor. O principal entrave para os novos investidores é o desenho do plano de negócios, que detalha a viabilidade econômica do projeto no futuro.
Um projeto de Edgard de Castro, da Companhia de Cinemas Populares, representa uma das iniciativas para levar o cinema a cidades de menor porte. A proposta ainda está tramitando no BNDES. Castro pretende construir 30 salas de cinema no interior de São Paulo.
25/06/07