Tradição Reciclada do Samba

Dudu Nobre

 

 

Em seu quarto disco de carreira, Festa em meu coração (Sony-BMG), o cantor Dudu Nobre faz concessões aos amantes do samba mais tradicional. Cheio de energia e idéias, o jovem sambista de 31 anos não deixa de introduzir algumas inovações no gênero, mas abre mão de opções arrojadas, como a utilização de guitarras nos arranjos. Por conta disso, é acusado de fazer uma música comercial e apelativa. Para ele, no entanto, a mídia é que anda carente de novos ídolos, e por este motivo sua imagem se desgastou, ao figurar constantemente em programas de TV e rádio.

– O problema é que, quando você começa a aparecer muito na televisão, acaba ganhando fama de popular nos guetos mais tradicionais. Mas a boa aceitação que eu tenho na TV acontece por causa da carência de novos sambistas que se disponham a fazer televisão. Quem surgiu entre 2000 e 2005? Teve Teresa Cristina, sem penetração na TV e na rádio, e teve o meu trabalho. E mais quem? – questiona o cantor.

Produzido pelo craque Rildo Hora (que cuida dos CDs de Zeca Pagodinho), o novo trabalho traz músicas de figuras celebradas pela alta roda do samba. Há composições de autores como Sinhô e Heitor dos Prazeres, que assinam Gosto que me enrosco, Pixinguinha e Gastão Viana (parceiros em Yaô) e Candeia (Pintura sem arte). Também estão presentes sambistas respeitados como Sombrinha, autor de Pra amenizar teu coração, Arlindo Cruz (em parceria com Jr. Dom), com Gasta aqui! Gasta lá!, e Nei Lopes, que assina Pega geral junto com Dudu Nobre.

O sambista também gravou Pega eu (o supra sumo da honestidade), de autoria de Criolo Doido, clássico do repertório de Bezerra da Silva, que participaria do CD – mas o compositor morreu em janeiro.

– De todos os meus discos, este é o mais forte e o mais equilibrado. Ele reúne todas as tendências e vertentes: desde o partido alto, até o samba de roda e o romântico. Procurei fazer um repertório que agradasse a todos, inclusive aos mais puristas – analisa o autor do hit Posso até me apaixonar, sucesso na voz do padrinho Zeca Pagodinho.

Apesar de dar voz aos clássicos, Dudu conta que faz questão de gravar nomes da atualidade:

– Eu me preocupo com a preservação do samba de Noel Rosa, Pixinguinha, Candeia e Cartola, embora o samba de Cartola seja mais lento e voltado para o romântico, enquanto minha praia é mais o samba de roda e o partido alto. Mas acho interessante gravar também outros nomes e não apenas os clássicos.

Dudu procura também gravar letras que fujam dos velhos clichês do gênero:

– Quero trazer uma temática nova para o samba e acho que estamos conseguindo. Antigamente, você ouvia sempre os mesmos versos: ”vamos encher a cara de cachaça”, ”a mulher da bunda grande”, ”meu barracão”. E, sobre isso, eu não canto. Às vezes tenho dificuldade em gravar outros autores, porque a temática não me agrada. Não posso me vestir de camisa de linho e sapato branco só porque era assim que se fazia. Preciso ter o meu próprio estilo.

Festa em meu coração mescla, portanto, o gosto de Dudu pela tradição mais a sua esperança de que o samba ganhe novos formatos. Outro dia, dando uma canja no pagode da Tia Doca, em Madureira, o cantor foi aplaudido ao cantar Cara valente, de Marcelo Camelo (vocalista do grupo Los Hermanos), sucesso na voz de Maria Rita. Se fosse na Lapa, diz ele, seria apedrejado pelo público purista:

– Não importa se a Maria Rita cantou e o Marcelo escreveu. Aquilo ali é samba! Toda vez que tento uma inovação tem sempre uma galera fazendo restrições. Eles acham que samba tem que ser feito com chapéu de palha. Ninguém é obrigado a gostar do meu trabalho, mas todo mundo tem que respeitar: estou construindo uma carreira.

João Bernardo Caldeira

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