Exposição Mary Vieira
Está em cartaz no Centro Cultural Banco do Brasil de São Paulo a exposição Mary Vieira – O Tempo do Movimento. É a primeira vez no país que a obra da artista é reunida em um conjunto significativo de esculturas, serigrafias, maquetes e fotografias, de modo a traçar o percurso estético de Mary Vieira (1927-2001) desde o início de seu trabalho, no final dos anos 1940, ainda no Brasil, até sua morte, na Europa. “Sua coerência, precisão e abrangência do pensamento estético nunca foram mostradas integralmente no seu país de origem. A mostra é a oportunidade de resgatar esta artista internacional que, segundo (o também artista) Markus Kütter, ‘sempre carregou sua origem brasileira como um manto em volta de si”, pondera a curadora do evento, Denise Mattar.
O evento, que contou com a consultoria do Istituto Internazionale Studi sul Futurismo (ISISUF), tem com objetivo resgatar um pouco do trabalho dessa artista que é considerada um dos maiores nomes da arte cinética no mundo. “Há algum tempo, venho desenvolvendo um trabalho de curadoria que busca dar visibilidade de grandes nomes que hoje estão esquecidos. No país, além da falta de patrocínio e incentivo às artes, ainda temos de lidar com a memória curta do brasileiro”, diz Mattar.
A exposição traz peças de coleções suíças, do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro – Coleção Gilberto Chateaubriand; Museu de Arte Brasileira da Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP); Museu de Arte Moderna de São Paulo; e do Arquivo Belloli-Vieira, instituto que realiza pesquisas, avaliação e autenticação do trabalho da artista. Em comum, a maior parte das obras traz para o centro da discussão a questão das possibilidades de relação entre peça e público. “Existe uma palavra que eu gostaria de ressaltar: interatividade. Ao mesmo tempo em que este é um dos objetivos do CCBB com a comunidade, é também a marca de Mary Vieira”, diz o gerente-executivo de marketing institucional do Banco do Brasil, Carlos Netto.
As obras estão dispostas no segundo e no terceiro andar, e no subsolo do CCBB. No hall há a projeção de um filme de Rubens Richter sobre o Polivolume: Ponto de Encontro, monumento localizado no Palácio Itamaraty, em Brasília. No segundo andar estão as esculturas, as quais exploram as inúmeras possibilidades de mutação da forma e da luz, em um diálogo constante com os visitantes. No local, monitores disponibilizam luvas de borracha para que o visitante possa interagir com algumas peças, recriando e remodelando-as a sua maneira. Já obras como Tempos de um movimento: luz-espaço a + b, de 1955, por exemplo, apresentam as possibilidades plásticas da reta e da curva, e traduz o período em que Vieira teve uma troca intensa tanto no plano particular quanto no artístico-intelectual com o artista italiano Carlo Belloli, que viria a se tornar seu marido.
O terceiro andar foi reservado para uma seleção das obras monumentais, aqui representadas por projeções, backlights e maquetes. A artista destacou-se pelo seu domínio estético em espaços públicos na Europa e no Brasil, como na escultura de quatro metros de altura Polivolume: Conexão Livre (1953), feita em homenagem a Pedro de Toledo e hoje situada no Parque do Ibirapuera (SP). Nesse andar também é apresentado um filme realizado especialmente para esta exposição, dirigido por Virginie Otth e Adrien Cater. A película fala sobre a obra Polivolume: Função de Forças Opostas (1975), localizado no interior do Instituto de Anatomia Patológica da Faculdade de Medicina da Universidade de Basiléia (Suíça). Um documentário feito em 1967 pela televisão Suíça, no qual a artista discorre sobre seu trabalho e sua visão da arte, é a outra atração.
O subsolo acomoda as obras de arte aplicadas e um panorama sobre sua experiência acadêmica e teórica. Em uma grande cronologia, estão reunidos fatos biográficos, informações sobre obras, trechos de entrevistas e declarações de críticos sobre o trabalho da brasileira.
De Minas para o mundo
Mary Vieira nasceu em São Paulo e foi criada em Minas Gerais. Seus primeiros estudos em artes foram com pintor Alberto da Veiga Guignard, em Belo Horizonte. Em 1947, expôs no Salão dos Jovens Artistas Brasileiros, e, um ano depois, realizou as primeiras maquetes de uma obra dinâmica, a qual incitava a participação do público.
Na 1ª Bienal de São Paulo, em 1951, teve uma agradável surpresa ao se deparar com a obra Unidade Tripartida, do suíço Max Bill (1908-1994). “Quando comecei, o meu ambiente não me deu parâmetros para medir o valor ou o desvalor das formas livres. Estava decidida a ir para a Europa: lá pretendia procurar pessoas em cuja vida e trabalho poderia me certificar em que pé estaria na minha busca de formas novas. Mas meu trabalho foi poupado de forma completamente inesperada. Na exposição, vi as obras que mostravam de uma forma finalizada, aquilo que eu estava tentando”, conta em entrevista que deu já em Zurique, em 1954.
No mesmo ano em que conheceu Bill, estabeleceu-se na Europa e foi acolhida pelo grupo dos concretistas suíços. “A historiografia comete um erro muito comum em relação à Mary Vieira. Normalmente, diz-se que ela foi como estudante para a Suíça. Isso não é verdade: ela já foi pronta. Mary foi recebida como uma jovem e promissora artista, como uma igual”, diz Mattar. Uma prova disso é que já em 1953, a artista recebeu o Prêmio Escultor Brasileiro do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, na 2ª Bienal de São Paulo. Em 1957, casou-se com Belloli, com quem viveu e trabalhou entre a Suíça, a Itália e o Brasil.
Hoje, muitas de suas obras estão situadas em locais públicos no Brasil, como na Praça Rio Branco, em Belo Horizonte, e no Ministério das Relações Exteriores, em Brasília; e no exterior, como na Biblioteca da Universidade da Basiléia e no Parque Seefeldquai, ambos na Suíça. Além de esculturas, Mary Vieira também desenvolveu projetos como urbanista, designer gráfica e professora da Kunstgewerbeschülle, na Basiléia.
Por Luciana Tie
Mary Vieira – O Tempo do Movimento
CCBB São Paulo
De 29 de janeiro a 27 de março
Entrada franca
Rua Álvares Penteado 112. Centro
Tel: (11) 3113-3651
E-mail: ccbbsp@bb.com.br