Carta Aberta constatando um Fato!

Carta Aberta constatando um Fato!  

A crise que ora atravessamos, nos músicos, compositores, instrumentistas, arranjadores, cantores e agentes musicais aqui no Paraná, não é só de caráter econômico ou social, mas de civilização, pois os principais problemas contemporâneos são também culturais e de valores humanos. Os seres humanos anseiam, mais do que nunca, por bens materiais para sobreviverem, mas também desejam fruir de bens simbólicos, imateriais (culturais ) e espirituais. É preciso compreender que a solução dos nossos problemas parte da resolução das múltiplas necessidades da vida.

É nesse contexto que assume centralidade jamais vista a questão do direito à cultura como direito humano, pois o próximo salto da humanidade deverá ser cultural. A transição para um desenvolvimento sustentável deve privilegiar um estilo de vida que leve em conta os valores culturais.

Um dos resultados negativos da globalização é um amplo desenraizamento que desfaz modos de vida locais, expropria milhões de seres humanos de suas referências culturais e de suas próprias vidas. Assim, todo um processo cultural entra em decadência e, em troca, é oferecido um padrão fabricado pelo consumo, que tem na mídia um emulador permanente, pasteurizando todo e qualquer tipo de diferença.

Isso resulta da atual visão dominante do desenvolvimento que pretende transformar a todos em consumidores passivos, subordinados à mão invisível da economia e não em cidadãos ativos e participantes de processos vitais. É de se destacar o descaso das políticas públicas em relação aos jovens das periferias das cidades, jogados ao seu próprio destino, marcado desde cedo pela dura realidade da falta de alternativas, e tendo como horizonte de sobrevivência a droga e o tráfico.

Apesar de tudo isso, há uma dinâmica cultural intensa – movimentos de jovens, artistas, mulheres, indígenas, negros, movimentos ecológicos, experiências democráticas de governos -, interessados em promover a identidade e o desenvolvimento cultural. Tal ação vem ocorrendo principalmente nos municípios e em muito tem contribuído para a construção da cidadania cultural.

Nesse contexto, a arte, além de ser a linguagem mais compreendida pelos jovens, traz para um mundo movido obsessivamente pelo ter, e não pelo ser, o encantamento e a criação de verdadeiras comunidades de emoção.

O governo não deve mais viver alheio a estes novos olhares e vozes que renovam a vida das nossas cidades, contribuindo para a elevação da auto-estima das pessoas e para a criação de um forte sentido de pertencimento à comunidade. Governo e sociedade devem trabalhar para construir juntos uma cultura democrática, componente central do desenvolvimento humano, que supere o autoritarismo e o clientelismo e a privatização do bem público por grupos de interesse, ainda muito presentes.

Ocorre que fomos surpreendidos com a noticia de que a Secretaria de Estado da Cultura, ao arrepio da vontade da classe organizada, sem sermos consultados, indicou como representante musical do Paraná o grupo Fato.

Vamos aos FATOS:

A Música Popular produzida no Paraná é um FATO. A qualidade, indiscutível; e a cada ano se sucedem lançamentos de trabalhos variados do ponto de vista estético/musical. 

Mas parece que há apenas um “FATO” que aparece aos olhos e soa aos ouvidos dos “dirigentes” da cultura no Estado. Ou, se não: Aniversário de Curitiba; comemoração, show promovido pelo Teatro Guaira e pela Prefeitura de Curitiba – Quem sobe ao palco? Um “Fato”. E os outros Fatos?

Trabalhos de compositores, instrumentistas, arranjadores e intérpretes, onde? Há pelo menos 100 trabalhos de criação individual ou coletiva capazes de representar condignamente a cultura musical do Paraná. Seja em Teatros, Praças Públicas ou ainda na Praça onde a Bastilha funcionou em terras de França.

A promoção democrática da cultura e da arte paranaenses não é um Fato.

À sombra da “Bastilha”, convocamos urgentemente dirigentes municipais e estaduais para explicações devidas e ações que gerem novos Fatos em beneficio da coletividade e da cidadania.

Lembrando que apenas sete prisioneiros eram guardados pela fortaleza parisiense que serviu como prisão do Estado absolutista francês, desde Luis XIII (1610-1643). Mais do que a libertação dos presos, a queda da Bastilha serviu como marco do fim da era dos “reis-sóis” na França, numa Revolução que foi caracterizada pelos ideais iluministas, sendo anunciada e defendida por filósofos como Voltaire, Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), Denis Diderot (1713-1784) entre outros. Liberdade, Igualdade e Fraternidade tornou-se o lema que motivava as ações contra o arbítrio e a desigualdade entre as classes sociais, pelo menos até Robespierre inaugurar o período do Terror, durante a reforma do Estado francês o que não gostaríamos de ver traduzida em Fatos lamentáveis nos dias de hoje.

Consideramos os colegas componentes do referido Grupo com elevada capacidade estético/musical e inquestionável talento. Aliás como outros tantos espalhados e sufocados por ações governamentais conduzidas por falta de sensibilidade ou estrabismo na administração de políticas culturais.

Queremos uma Política Cultural que democratize a gestão das ações da Secretaria de Estado da Cultura do Paraná e inclua a sociedade organizada nas decisões culturais e nos processos participativos. Queremos uma Secretaria de Cultura e demais órgãos que respeite os valores humanos e os vários segmentos que compõem a vida musical local.

Cultura musical é também qualidade de vida e qualidade de Ser.

O desenvolvimento não pode ser promovido sem a Cidadania Cultural e Musical com a participação de todos os seus agentes.

Uma sociedade sustentável promove o equilíbrio cultural, o pluralismo e a solidariedade.

 

Fórum Permanente da Música do Paraná

 

 

Coordenação Estadual

 

 

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