Carnaval de Rua livre e público como política de Estado

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São Paulo precisa consolidar uma das mais bem-sucedidas políticas de Carnaval de Rua do País. Depois de quatro anos de intenso trabalho, de formulação, diálogo e implementação das ações que organizaram o território urbano para blocos e foliões, realizado pela Secretaria Municipal de Cultura (SMC), o ethos momesco foi completamente absorvido: pelo poder público, com a capacidade e expertise criadas; e pelos cidadãos, com o espírito livre, alegre e criativo que toma as ruas da capital. Resta, agora, sacramentar essa política, transformando-a em uma política de Estado que preserve as características desse Carnaval de Rua que deu certo em São Paulo.

 

Respaldados pela experiência de ter administrado, na Secretaria Municipal de Cultura, o Carnaval de Rua de São Paulo na gestão Haddad, propusemos o Projeto de Lei 298/2016, que dá força legal às diversas medidas executivas e administrativas que potencializaram o evento na cidade.

 

O PL disciplina princípios, responsabilidades, regras, modelo de sustentabilidade econômica, apoios e serviços a serem prestados no Carnaval, mantendo o protagonismo e a liberdade dos blocos de rua, os grandes responsáveis pelo evento. O objetivo é valorizar e potencializar a convivência no espaço público e compatibilizar o planejamento urbano para os festejos com o respeito aos moradores dos bairros.

 

 

Este PL do Carnaval de Rua é o resultado normativo de uma política cultural estruturada em etapas, executadas ano a ano, cuja evolução é evidente. Em 2013, a SMC abriu um debate com grande parte dos blocos da cidade, que trouxeram um pleito objetivo: liberar o Carnaval de Rua. Inicialmente foi o que se realizou. De praticamente proibidos, os blocos passaram a ser reconhecidos, valorizados e liberados para a folia.

 

Depois de muita formulação, estudos técnicos e diálogo com blocos e moradores, a prefeitura passou a organizar a cidade e seus serviços (trânsito, limpeza, comunicação, atendimentos de saúde, segurança) para garantir as condições para que o Carnaval de Rua tivesse a grandeza da Pauliceia.

 

Com a melhora gradativa da organização, de 2014 a 2016, os resultados foram muito positivos e concretos, atendendo à demanda da sociedade e dos grupos culturais. Ademais, buscou-se otimizar os recursos financeiros, obtendo-se parcerias privadas e patrocínios, através de editais públicos abertos a todos, o que contribui para a sustentabilidade do evento.

 

As medidas surtiram efeito: o Carnaval de Rua de São Paulo foi o que mais cresceu no Brasil nos últimos quatro anos. Em 2013 eram apenas 70 blocos; em 2014, 200; em 2015 eram 260, alcançando-se 360 blocos em 2016. Em 2017, o cadastro dos blocos, realizado pela prefeitura, aponta que teremos cerca 500 blocos pela cidade. Esperam-se cerca de três milhões de foliões nos festejos.

 

As ruas foram tomadas por milhões de paulistanos e paulistanas; hoje, muitos deixam de viajar para curtir o Carnaval na cidade, potencializando sua economia. São Paulo agora integra os trajetos prioritários de turismo do Carnaval e, diferentemente de alguns anos atrás, está preparada para quem quer curtir a festa.

 

Atualmente, há consenso que o modelo do Carnaval de Rua de São Paulo deu certo. Nessas bases, ele foi regulamentado pelo decreto 56.690, proposto pela Secretaria Municipal de Cultura e assinado pelo prefeito Haddad. É necessário, no entanto, transformar esse modelo em uma política de Estado, imune a retrocessos. É o que buscamos apresentando o PL 298/2016, que precisa ser analisado e aprovado pelo plenário da Câmara.

 

Nesse PL, fica cristalizado que o Carnaval de Rua deve ser público, gratuito, de participação livre e voluntária, mantendo a criatividade e espontaneidade das manifestações; garante-se o pleno uso do espaço público, com livre acesso e sem discriminação por cordas e abadás; distingue-se o Carnaval de Rua do Carnaval das escolas de samba, realizado no Sambódromo, que possui outro arranjo econômico, demanda outros serviços públicos e, por consequência, requer outra regulamentação; retiram-se o excesso de burocratização na relação com o poder público e a necessidade de institucionalização dos blocos para a obtenção de apoio.

 

Fica também estabelecido o planejamento urbano e territorial do Carnaval, com definição da responsabilidade de cada órgão municipal; instituem-se diretrizes fundamentais para a prestação dos serviços e redução de impactos; fica previsto o tratamento especial para áreas críticas; prevê-se o respeito aos itinerários dos blocos, com a possibilidade de alterações, pactuadas, para a resolução de conflitos; cria-se o Plano de Apoio ao Carnaval de Rua de São Paulo, que garante a estrutura mínima e necessária para os desfiles; e se cria a possibilidade de captação de recursos privados para o custeio da infraestrutura geral, logística e dos demais serviços necessários para a realização dos desfiles, desde que respeitado outras normas importantes da cidade, como a Lei Cidade Limpa.

 

O espírito da futura Lei do Carnaval de Rua expressa o desejo profundo da população de viver plenamente a sua cidade. Consagra a valorização do espaço público, a apropriação plena, ativa e afetiva, das ruas e bairros pelos cidadãos, e a ressignificação do cenário urbano pela alegria e criatividade de quem faz, brinca e vive o Carnaval. Em verdade, é uma lei que garante o direito à cidade pelo pleno exercício do direito à cidadania cultural e à folia.

 

 

 

*Guilherme Varella é gestor cultural, foi secretário de Políticas Culturais do MinC (2015-maio/2016) e chefe de Gabinete da Secretaria Municipal de Cultura (2014/2015).  Nabil Bonduki professor titular na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP e vereador de São Paulo (PT), foi secretário municipal de Cultura (2015-2016).

 

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