Vamos falar sobre a história eleitoral do Brasil, lembrar o momento em que as mulheres votaram pela primeira vez e explicar para as internautas a diferença entre senadora, deputada federal, deputada estadual e vereadora. Assim, a gente já vai fazendo a cabeça para participar de um processo que é essencial para o Brasil tomar o rumo que merece.
Bom, até 1827, as eleições eram um privilégio de poucas pessoas que, em uma espécie de colegiado aristocrático, decidiam quem iria compor o poder e decidir pela nação. Não esqueçamos que vivíamos em pleno Império, neste sentido, quando falamos em eleições, estamos nos referindo aos deputados e senadores.
A primeira eleição direta no Brasil, aquela que é fruto do voto, foi estabelecida pela Lei Eleitoral de 1828, que regulamentava as eleições municipais, ou seja, para vereadores. Em 1881, a Lei Saraiva determinava que as nomeações de senadores e deputados para a Assembléia Geral, membros das Assembléias Legislativas provinciais e quaisquer autoridades eletivas seriam feitas por eleições diretas. Ao criar o sistema presidencialista, a primeira Constituição Republicana, de 1891, estabelecia que o Presidente e o Vice-Presidente da República fossem eleitos por sufrágio direto da nação. Não é preciso nem dizer que até meados do século XX, política era coisa de homem e nem pensávamos, nós mulheres, que algum dia teríamos que nos responsabilizar pelos nossos direitos.
O direito de votar e ser votado sofreu alguns golpes na historia do Brasil. O primeiro cunhado por Getúlio Vargas, em 1937, quando ele estabeleceu o Estado Novo. O segundo, mais terrível e prolongado, aconteceu depois do golpe de 64, quando todas as eleições foram proibidas e, por algum tempo, o direito de pensar diferente também, como vimos na coluna da semana passada.
As eleições diretas para Presidente da República só foram restabelecidas pela Constituição de 1988. Tanto tempo sem exercer a atividade política, tantas gerações que não conheceram este direito, que quase nos tornamos um povo analfabeto em seus direitos civis. Recuperar o tempo perdido é uma meta, amadurecer nossa postura cidadã é ainda uma conquista a ser feita pelo brasileiro. Felizmente, esta consciência só se adquire quando nós votamos e, através da postura dos parlamentares diante das questões cruciais do Brasil, como educação, cultura, economia, miséria, trabalho etc, reconhecemos nossos erros e acertos, e buscamos melhorar no pleito seguinte.
Para isto é preciso saber quais são os órgãos que realizam as eleições e o que significa cada cargo que votamos.
O primeiro é o Tribunal Superior Eleitoral. Criado em 24 de fevereiro de 1932, comanda todo o processo eleitoral, é responsável pela contagem dos votos nacionais e nas delegacias regionais, pelo resultado das eleições parciais. Foi o TSE que exigiu, em 2002, a coerência dos partidos políticos, que só poderão fazer coligações regionais com os mesmos partidos feitos nas coligações nacionais. Definitivamente, uma moralização do nosso sistema eleitoral, mesmo que acontecida somente 80 anos depois da criação do TSE.
Junto com o TSE, foi criada a Justiça Eleitoral, pelo Decreto 21.076 de 24 de fevereiro de 1932. É ela que supervisiona o alistamento, as eleições e a propaganda eleitoral, ou melhor, é ela quem cuida dos cabos eleitorais e dos roubos de urnas, que, pasmem, ainda ocorrem em muitos lugares do Brasil. Foi também em 1932 que o voto secreto começou a vigorar.
Agora, vamos à confusão: os partidos políticos. Os primeiros partidos surgiram em 1831, eram eles: o Restaurador (pela volta de D. Pedro I), Republicano (pela abolição da monarquia) e liberal (pela reforma da constituição de 1824, mas conservando a forma monarquia). Mas a verdade é que durante todos estes anos conhecemos dois lados: o governo e a oposição, ou melhor, a direita (ordem = governo) e a esquerda (desordem, gauche = oposição). Hoje, ainda encontramos esta divisão. Muitos candidatos de direita estão na esquerda e vice-e-versa, porque no Brasil as diferenças regionais não permitem uma unidade com a política nacional. Teremos que comer muito pão para chegarmos lá.
Em 2002 os brasileiros vão escolher o Presidente da República, senadores, governadores, deputados, prefeitos e vereadores. Para se eleger, presidentes e governadores precisam ter um mínimo de 50% dos votos válidos. Caso isso não ocorra, haverá segundo turno.
Como foi toda esta história para as candidatas mulheres?
Na constituinte republicana de 1890, por iniciativa de Lopes Trovão e outros, foi apresentada uma emenda, concedendo direito de voto à mulher. Mas esta foi rejeitada e o motivo alegado pelos republicanos é que não havia um movimento feminino para acompanhar os debates.
Em 1921, a campanha pelo voto feminino começou a ganhar expressão no cenário político brasileiro. Berta Lutz, de quem já falamos aqui na coluna, em entrevista ao jornal citou exemplos de outros países como Rússia (depois da revolução socialista de 1917), onde as mulheres figuravam na constituição e tinham plena igualdade com os homens; a Finlândia, um dos primeiros países a estabelecer o voto feminino sem restrições, além da Suécia, desde 1862, Noruega em 1913, Dinamarca, 1915, Holanda, Letônia, Grécia, Áustria, Polônia, Inglaterra, EUA e México e conclamou as mulheres brasileiras a participarem da luta pelo voto e pela candidatura feminina.
A campanha foi tão expressiva que as brasileiras se organizaram na Federação Brasileira pelo Progresso Feminino e, durante mais de uma década, se movimentaram fundando o Partido Republicano Feminino, o Partido Liberal Feminino, a Aliança Nacional de Mulheres, a Legião da Mulher Brasileira e a Junta Feminil pró-Hermes/Venceslau, que foi a primeira agremiação a colaborar com as eleições presidenciais.
Em outubro de 1922, o Congresso Jurídico Brasileiro aprovou por grande maioria a constitucionalidade e a oportunidade do voto feminino. Em 1926, o jornal Folha da Noite noticiava que no Congresso de Minas Gerais se discutia um projeto de reforma da Constituição do estado, visando aprovar uma emenda concedendo às mulheres o direito de votarem e serem votadas nas eleições estaduais. Na mesma época, Juvenal Lamartine defendia na Plataforma de Governo, no Rio Grande do Norte, o voto feminino. Foi eleito e deu início ao seu programa administrativo. O artigo 77 das Disposições Gerais da Lei Eleitoral, daquele estado, consagrava a conquista feminina.
por Mariana Várzea