In memorian: Nestor Tangerini
(Encaminhada pelo artista plástico Wangui)
Quanto mais realce tem a pessoa na sociedade, tanto mais está sujeita à língua ferina dos despeitados. Se herdou fortuna, descende de ladrões; se enriquece por esforço próprio, está roubando; se ganha na loteria, Deus ajuda a quem não merece; se conquista posição mais saliente, só o lograria com proteção ou meio inlouvável.
O rico é a inveja do pobre; o indivíduo de sorte, do pesado; o talentoso, do medíocre; o de cima, do que está por baixo.
Qualquer melhor situação na vida sempre dá motivo para ter o maldizente o que falar, não lhe faltando nunca recursos de arrumar por onde pegue a vítima.
Filha de gente rica e de posição, a jovem Gilda cedo arranjara um noivo. Até aí, nenhuma novidade. Mas, foi-se o tempo correndo, os anos se passavam e nada de casamento, começando então, aqui, a pegar o carro.
O noivo não era nenhum pronto, e tinha, também, o seu cartaz social, não se justificando, portanto, aquele noivado crônico.
Ali havia coisa…
Do “havia coisa”, passaram a dizer que Gilda era amante do noivo, e que o casamento jamais se realizaria, por haver perdido a graça.
Um belo dia, porém, todo em festa o palacete dos pais de Gilda, e limosines e limosines que param à porta, despejando figuras de alto bardo; e, nisto, o juiz que chega.
Gilda se casara…
Consumado o ato civil, ei-los, os noivos, arrastando interminável cortejo de carros, destinado à igreja, deixando, assim, a todos os linguarudos com cara de alicate.
Foi tão grande a surpresa, e tamanho o acontecimento, que até hoje se fala, em São Cristóvão, no casamento da Gilda, não só pela duração do noivado como por aquela romaria incalculável de grã-finos.
Ainda ontem, por exemplo, comentavam duas vizinhas:
– A Gilda e o noivo tinham muitas relações – relembrou dona Santa.
E dona Inocência:
– Tantas, minha filha, que, quando conseguiu entrar na igreja, estava na hora do batizado…
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