O CARÁTER DO BRASILEIRO DEBRETJean-Baptiste

O solo variado do Brasil, apresenta sucessivamente as diferentes temperaturas européias, cuja influência se faz sentir no caráter moral e físico do habitante a ela submetido desde o nascimento. Essa variedade de temperatura explica, também, a variedade notável que existe entre os brasileiros de cada uma das províncias desse vasto império.

O brasileiro, geralmente bom, é dotado de uma vivacidade que se vislumbra nos seus olhos pretos e expressivos, feliz disposição natural que ele aplica com êxito no cultivo das ciências e das artes. Sua tendência inata pela poesia inspira-lhe o gosto do belo ideal, do sobrenatural nas suas narrativas, principalmente quando fala de seu país; seu amor-próprio, que nisso se compraz, torna-o em geral contador de histórias com as quais procura causar impressão e provocar o espanto e a admiração do auditório. Suas faculdades naturais declinam na proporção da menor altitude em que habita. Mais fraco, então, e conservando apenas a vivacidade do espírito brasileiro, nos outros unida à força, não passa de um homem fértil em projetos, subjugado pelos seus desejos, que se sucedem demasiado rapidamente e cuja execução ele abandona por completo, julgando-a frivolamente penosa ou aborrecida. Nem por isso se mostra menos exigente quanto à perfeição dos objetos submetidos à sua crítica; mas é suficiente satisfação para seu amor-próprio descobrir-lhe os defeitos. É, no entanto, paciente nos trabalhos manuais. Aliás, gosta bastante do repouso, principalmente durante as horas quentes do dia, desculpando-se sem cessar com sua má saúde, de que parece afligir-se no momento mas que esquece logo para divertir-se com uma piada ou uma maledicência engenhosa cujo segredo recomenda “pro-forma”. Minha observação, repito-o, baseia-se inteiramente nas variações da atmosfera, pois é fácil de compreender que um clima continuamente quente e úmido, debilitando as forças físicas, torna o homem preguiçoso na realização de sua vontade, embora seja ele dotado de um espírito vivo e penetrante.

O ancião, no Brasil, vivendo retirado na sua residência rural, tem a voz dura por hábito e a conserva aguda por necessidade pois passa a existência a fiscalizar empregados que tentam enganá-lo e escravos preguiçosos e indolentes que procuram não fazer nada. Mas seu coração não sofre dessa tendência do espírito, pois mostra-se sempre generoso e hospitaleiro.

O habitante do Brasil é bem feito; anda de cabeça erguida, mostrando assim sua fisionomia expressiva; as sombrancelhas são bem marcadas, pretas como os cabelos; os olhos grandes e vivos, os traços móveis e o sorriso agradável. Sua estatura geralmente pouco elevada dá-lhe uma grande flexibilidade e muita agilidade. Veste-se, na cidade, com um asseio meticuloso; cuida principalmente dos sapatos, pois não ignora que tem o pé pequeno e bem feito.

O luxo europeu o seduz: compraz-se em adotá-lo e, nas capitais das províncias, não é mais estranho a nossos costumes. Nas reuniões brasileiras a dança e a música brilham entre elegantes toilettes imitadas da moda francesa mais recente.

No Rio de Janeiro, mais compenetrado, como membro da Câmara dos Deputados, vemo-lo, orador sutil e brilhante, orgulhoso de sua erudição, citar os menores incidentes da Revolução Francesa desde 1789. Pródigo em sutilezas lógicas que ele aprecia, é-o também, incontestavelmente, do tempo precioso consagrado a uma discussão; mas, no dia seguinte, de sangue frio, seu coração sinceramente patriota censura ao seu espírito a perda de tempo que na véspera seu entusiasmo provocou sem vantagem para o bem público.

Eis o homem que em três séculos viveu toda a civilização da Europa e que, instruído por seu exemplo, poderá brevemente apresentar rivais no talento, assim como a América do Norte lhe apresenta modelos de virtude.

(DEBRET, Jean-Baptiste)

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