Uma importante conquista na luta contra a homogeneização da cultura em âmbito mundial aconteceu no último dia 18 de março quando começou a vigorar a Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais, que determina tratados políticos e um conjunto de regras que garantem aos países participantes a implantação de mecanismos de defesa das culturas locais contra a hegemônica indústria do entretenimento.
A Convenção já havia sido aprovada na 33ª Conferência Geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), que aconteceu em Paris, em outubro de 2005, mas precisava da adesão de pelo menos 30 países. De lá para cá, inúmeras reuniões entre especialistas representantes dos diversos governos envolvidos na questão serviram de balizamento para a propositura do texto final. 52 das 148 nações que deram voto favorável em 2005 assinam a Convenção com obstruções geradas apenas por dois países: Estados Unidos e Israel (leia mais) e duas abstenções: Austrália e Kiribaty.
Com o objetivo de estreitar os vínculos que unem a cultura com o desenvolvimento sustentável e fomentar o diálogo entre as culturas, a Convenção reitera o respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais, a igual dignidade das distintas culturas, o acesso equitativo às expressões culturais e a abertura às culturas do mundo.
Além da propositura da criação de mecanismos de defesa para as culturas locais, com a preservação das estruturas culturais a fim de que se possa qualificar o desenvolvimento a partir do patrimônio cultural, a Convenção contempla a demanda gerada pela aceleração do crescimento da produção cultural em todo o planeta e pela necessidade de interação entre tantas expressões de diversidade tão extensa. Para dar suporte financeiro a tal propositura, foi criado o Fundo Internacional para a Diversidade Cultural, que deverá receber recursos a partir de contribuições voluntárias incentivadas pelos governos participantes. As partes reconhecem o papel fundamental que desempenha a sociedade civil e se comprometem a fomentar sua participação ativa. Além disso, está prevista, para um encontro em Paris no final deste semestre, a criação de um comitê internacional responsável pela gestão da Convenção.
Com a entrada em vigor da Convenção, a UNESCO conta atualmente com um marco jurídico completo integrado por sete convenções (*leia no fim desta matéria) que englobam a diversidade cultural em seu conjunto, e mais concretamente dois pilares essenciais da cultura: o patrimônio material e imaterial e a criação contemporânea.
Brasil protagonista
A atuação do Brasil, representado pelo Ministro da Cultura, Gilberto Gil, foi decisiva para a articulação dos países signatários da Convenção e rendeu uma menção de distinção feita pelo representante da Unesco no Brasil, Vincent Defourny. Em suas viagens à África, Ásia e América Latina, Gilberto Gil sempre buscou o engajamento dos ministros de cultura com quem estabeleceu contato a fim de agregá-los na árdua tarefa de “tirar da Organização Mundial do Comércio (OMC) todas as negociações que ultrapassam os limites econômicos, criando a possibilidade, sob a chancela da ONU, de se estabelecer mecanismos de proteção aos interesses culturais de comunidades e povos. A globalização será um enorme peso se ficarmos à mercê da regulação puramente econômica. A Convenção cria legitimidade internacional, dá possibilidades aos Estados nacionais de se protegerem. As convenções são tratados que passam a ter validade e refletem-se em leis nacionais.” – lembra o secretário executivo do MinC, Juca Ferreira.
O secretário ainda destaca que a Convenção não tem caráter autorizativo, normatizador ou determinante. Ela apenas cria a possibilidade de proteção internacional, cabendo a cada país e às comunidades locais de cada um deles estabelecerem o que precisa ser protegido e quais os mecanismos adotados para tal finalidade. Inclusive no Brasil que, embora seja o único país do mundo a apresentar uma secretaria em seu ministério da cultura específica pra tratar da questão da identidade e da diversidade cultural, ainda tem muito por fazer.
“Queremos que o Estado possa determinar soberanamente o modo como vai divulgar, expor, distribuir, comprar ou vender os produtos culturais. E que todos tenham acesso pleno a toda a produção cultural do mundo e que o mundo tenha acesso a tudo o que se produz no Brasil”, comentou a assessora especial do MinC para Assuntos Internacionais, Nazaré Pedroza.
Assim, a construção de trocas culturais mais democráticas na área internacional garante o acesso da população dos países à diversidade cultural do mundo inteiro. “A Convenção ajuda a acabar com o isolamento entre as culturas e estabelece mais relações Sul-Sul. O poder econômico da indústria cultural impede que a tecnologia geradora do fenômeno da globalização dos meios de comunicação multiplique a diversidade da Cultura. A Convenção da Diversidade Cultural pretende proteger os países menos favorecidos do “rolo compressor” da cultura dos países do Norte” – afirma Marcelo Coutinho, representante do MinC no Comissariado da Cultura Brasileira no Mundo.
(*) Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais (2005); Convenção para a Salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial (2003); Convenção sobre a Proteção do Patrimônio Cultural Subaquático (2001); Convenção para a Proteção do Patrimônio Mundial Cultural e Natural (1972); Convenção sobre as medidas que devem ser adotadas para proibir e impedir a importação, a exportação e a transferência de propriedades ilícitas de bens culturais (1970); Convenção para a Proteção dos Bens Culturais em caso de Conflito Armado (1954); e Convenção Universal sobre Direito de Autor (1952 e 1971).
(Com informações da Secretária de Comunicação Social do MinC e da Unesco).
http://agenciacartamaior.uol.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=13753&editoria_id=12
Eduardo Carvalho
26/03/07