Iphan quer modernizar políticas de tombamento

iphanDe tudo o que está sendo construído atualmente, o que será preservado daqui a 50 anos? “Está na hora de os brasileiros se fazerem esta pergunta”, afirma o arquiteto mineiro Luiz Fernando de Almeida, de 48 anos, presidente do Instituto do Patrimônio Artístico e Nacional (Iphan) desde 2006. O órgão tem a responsabilidade de proteger, preservar e divulgar os principais cartões-postais do país: Ouro Preto e Congonhas (MG), Corcovado (RJ), Pelourinho (BA) e a arquitetura de Brasília, por exemplo – acervo que orgulha os brasileiros. Tarefa nada simples, sujeita a polêmicas, poucos recursos e cobranças.

Como o tombamento é política da década de 1930, explica Luiz Fernando de Almeida, há bens apropriados pela sociedade que já são parte do imaginário do brasileiro e desfrutam de grande legitimidade junto à população. Ouro Preto é exemplo disso. “Qualquer coisa que ocorre lá, todo mundo – e não só o Iphan – protesta”, observa. Por outro lado, há bens alvo de discórdia. “O tombamento do encontro das águas dos rios Solimões e Negro, em Manaus, patrimônio paisagístico, foi bastante polêmico. Como havia a intenção de construir um porto no local, o processo gerou embate entre os valores simbólico e econômico”, conta.

O presidente do Iphan avisa: patrimônio é conceito de valor, está ligado à qualidade de vida. “Pode-se, com políticas patrimoniais, intervir no processo de desqualificação das cidades, o que significa desarticulação da vida urbana, ausência de espaços públicos que congreguem as pessoas”, acrescenta. Reverter isso se dá, primeiramente, como exemplo. Ou seja, mostrando que cidades do período colonial têm qualidade de vida, observa Luiz Fernando. “Depois, a construção do patrimônio do futuro é tema colocado para toda política pública. Se temos de erguer uma ponte, por que ela não pode ter qualidade arquitetônica?”, questiona.

IDENTIDADE O especialista lembra que o conceito de patrimônio surgiu na virada do século 19 para o 20, na Europa, regido pelo tema da identidade nacional, procurando proteger a excepcionalidade do artístico ou de bens alusivos a fatos históricos. “Atualmente, o processo está ligado a indicadores de qualidade de vida das comunidades, não se volta apenas para a história e o passado. Patrimônio cultural deixou de se ater às exceções para se tornar política pública”, pondera. “Toda comunidade tem seu patrimônio, ele agrega uma população e cria identidade coletiva compartilhada”.

Esse conceito vem sendo ampliado. “É o modo como a sociedade produz e usufrui de bens culturais. Não é algo estático, mas dinâmico e vem se expandindo”, reforça Luiz Fernando de Almeida. Em análise no conselho do Iphan estão grandes inventários do conhecimento de caráter regional, caso das embarcações tradicionais do litoral brasileiro, da marcha empreendida pelo marechal Rondon ou da rede ferroviária brasileira. “Conhecemos pouco esses bens. As análises vão gerar propostas de proteção que darão origem a novos patrimônios e a novas referências para políticas patrimoniais de estados e municípios”, explica

Na opinião de Luiz Fernando, a política de patrimônio cultural de Minas é bem consolidada. “Mas há desafios a serem enfrentados. É preciso ir um pouco além da onipresença do período colonial, do barroco e do rococó, compreender o patrimônio em dimensão mais ampla, de forma que incorpore todo o território do estado”, defende. Outro desafio: superar a setorialidade. “Patrimônio ambiental não pode ser só ambiental. Ele deve contribuir para o desenvolvimento urbano, industrial e econômico”. Um tema que conquista os holofotes, durante megaobras, são os sítios arqueológicos, lembra o presidente do Iphan.

VERBA Defesa do patrimônio remete à consciência cidadã ou a verbas? “As duas coisas andam juntas. A legitimidade política constrói a legitimidade para se conseguir mais recursos”, responde Luiz Fernando. Ele não esconde um paradoxo: “Todos dizem que o patrimônio cultural é importante, mas, quando se deparam com os recursos disponíveis, notam que são pequenos diante do muito a ser feito”, conclui.

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