Gil cede música para comercial de banco

 

Gilberto Gil

 

 

 

 

 

Tecnicamente, o ministro Gilberto Gil (Cultura) não infringiu o Código de Conduta da Alta Administração Federal.

 

Num comercial do Itaú Bankline, feito pela agência de publicidade África e que vem sendo veiculado na TV, outro cantor interpreta uma versão modificada de “Pela Internet”, canção de Gil que já havia sido tema de propaganda do banco antes que o compositor integrasse o governo de Luiz Inácio Lula da Silva.

 

O uso da música de Gil e a semelhança entre a voz que interpreta a canção e a sua, no entanto, dão margem a questionamentos éticos, dizem especialistas ouvidos pela Folha.

 

A socióloga Maria Victoria Benevides, integrante da Comissão de Ética Pública do governo federal entre 2003 e 2006, afirma que, se fosse Gil a cantar a música, haveria “um problema ético evidente” no fato de um ministro de Estado fazer uma propaganda para um banco, “ainda que fosse de graça” -já que poderia haver conflito de interesses entre esse trabalho e ações do ministério que dissessem respeito ao Itaú Cultural, por exemplo.

 

Estaria configurada “uma incompatibilidade flagrante”, afirma a socióloga.

 

A coisa muda de figura com o fato de a canção ser interpretada por outra pessoa. Entretanto, Benevides diz que a semelhança entre as vozes e a possibilidade de confusão criam uma situação “muito delicada”.

 

Questionada pela Folha, a assessoria que cuida de assuntos “artísticos” do ministro disse que “a editora de Gil aprovou a utilização da obra com autorização do autor”.

 

Informou ainda que “a mudança na letra foi feita pela agência” e que “a versão nova é de propriedade e uso exclusivo do banco Itaú por seis meses”. Ao final, ressaltou: “A voz usada no comercial não é de Gil”.

 

Para Benevides, a gravação da propaganda “não é um problema do ponto de vista do Código de Ética, mas é um problema do ponto de vista pessoal dele”. “Eu não teria feito”, ela afirma, para não gerar confusão.

 

“Fica uma coisa fronteiriça em relação a constrangimentos pessoais. É lógico que alguma atração em relação a quem fez isso tem a ver com o fato de ele ser ministro”, ela diz.

 

“Pessoalmente acho que, entrou no ministério, assumiu cargo público, não pode mais receber um tostão de lugar nenhum. As pessoas fazem escolhas na vida. Então agüentem enquanto estão lá [na administração federal].”

 

Roberto Romano, professor de ética e filosofia política na Unicamp, diz não ver gravidade maior no fato, mas afirma que a “clonagem” da voz de Gil torna “confuso o parâmetro de responsabilização”. “E é preciso ter parâmetros de responsabilização claros”, ele diz.

 

Apesar de a voz não ser do ministro, Romano diz que “a personalidade conhecida é ele”. “Ele não pode mais abdicar de si mesmo; Gil tem uma figura pública construída.”

24/07/07

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