Considerado um dos maiores instrumentistas da música popular brasileira, o flautista Altamiro Carrilho morreu na manhã desta quarta-feira (15), no Rio, aos 87 anos, vítima de um câncer.
O músico havia sido internado no mês passado num hospital em Copacabana, na zona sul do Rio, por complicações pulmonares. Ele chegou a passar três dias no CTI, e uma biopsia confirmou que Carrilho tinha neoplasia pulmonar (em que um tecido cresce de modo rápido e desordenado).
Carrilho tornou-se uma lenda do choro com uma extensa obra de cerca de 200 composições registradas em mais de cem discos, além de ter disseminado o gênero em vários países.
Sua família ainda não divulgou informações sobre o velório e o enterro.
VIDA E OBRA
Nascido na cidade de Santo Antônio de Pádua (RJ), Altamiro Carrilho foi criado em uma família musical. Filho de Lyra de Aquino Carrilho e Otacilio Gonçalves Carrilho, ganhou sua primeira flauta aos 5 anos. Ainda criança, começou a fabricar os próprios instrumentos, serrando bambus e descobrindo diferentes timbres e afinações para a suas flautas.
Aos 11 anos, começa a tocar caixa na Banda Lira Árion, que tinha seu tio como maestro. Em 1940, muda-se com sua família para Niterói. Ainda jovem, além de trabalhar na farmácia de seu tio, começa a ter aulas práticas e teóricas com Joaquim Fernandes, carteiro de seu bairro.
No começo da década de 1940, participa do “Calouros em Desfile”, de Ary Barroso (1903-1964), ganhando um prêmio acumulado em oito semanas no programa ao interpretar o difícil tema “Harmonia Selvagem”, de Dante Santoro (1904-1969), uma das referências de Altamiro como flautista.
Com a vitória, ganha projeção e é descoberto por Moreira da Silva (1902-2000). Em 1943, passa a acompanhar o sambista, participando de gravações pela Odeon.
Em 1950, forma seu primeiro conjunto e, no ano seguinte, passa a integrar o histórico Regional do Canhoto, substituindo nada mais, nada menos do que Benedito Lacerda (1903-1958) — flautista, compositor e parceiro de Pixinguinha em diversos choros antológicos.
Substituir Benedito Lacerda representava para o então garoto Altamiro uma responsabilidade imensa. O atestado de que ele tinha gabarito para tornar-se o sucessor de Benedito foi dado ainda na década de 1940. Ainda na década de 1940, a Rádio Tamoio apresentou, certa tarde, uma gravação de Altamiro com o regional de César Moreno. Em sua casa, Benedito escutou a interpretação e pensou que fosse uma gravação dele mesmo. Após sua mulher lhe contar que se tratava de um jovem chamado “Altamiro… Carvalho” (sic), Benedito fez questão de ir à rádio conhecer seu “discípulo” pessoalmente.
Logo depois, assina contrato com a Rádio Mayrink Veiga, acompanhando diversos artistas da casa, como Francisco Alves, Orlando Silva, Vicente Celestino, entre outros. Em 1955, forma seu próprio conjunto, Altamiro Carrilho e Sua Bandinha. No mesmo ano, em homenagem aos 400 anos da cidade do Rio de Janeiro — seguindo os passos de Chiquinho do Acordeon e Garoto, que tinham composto “São Paulo Quatrocentão” –, Altamiro compõe e grava com o grupo o tema de maior sucesso de sua carreira, o maxixe “Rio Antigo”. Em poucos meses, o registro quase bate a marca de um milhão de cópias vendidas, sendo considerado um fenômeno para a época.
Depois de gravações antológicas ao lado de sua “bandinha”, Altamiro mantém sua carreira em alta na década de 1960, com discos relevantes não só para o métier do choro, mas para a música brasileira em geral. Neste período, destaque para discos como “Era Só o que Flautava” (1960), “Desfile de Sucessos” (1961) e “Choros Imortais” (1964). Na mesma década, ganha projeção internacional com viagens e apresentações por países como Estados Unidos, União Soviética, México, Portugal, Espanha, Alemanha, França e Inglaterra.
Com mais de 200 composições em sua carreira e mais de 100 gravações em discos, a partir da década de 1960 Altamiro passa ser requisitado para gravar com importantes nomes da música brasileira. Entre diversos registros históricos, destaque para as gravações de “O Mundo é um Moinho” e “As Rosas não Falam” (1976), de Cartola, e “Meu Caro Amigo” (1976), de Chico Buarque.
Além deles, o flautista grava com artistas como Elis Regina, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Nara Leão, Jair Rodrigues, Beth Carvalho, João Bosco, Francis Hime, Luiz Melodia, Nelson Cavaquinho, Moraes Moreira, Elizeth Cardoso, Waldir Azevedo, Paulo Moura, Walter Franco, Zé Menezes, Cristina Buarque, Wagner Tiso, Luiz Eça, Raphael Rabello, entre outros.
Com mais de sete décadas de carreira, Carrilho é considerado por muitos como o maior flautista brasileiro de todos os tempos, com amplo domínio da técnica do instrumento, interpretando peças eruditas ou populares. Sua marca como instrumentista foi ser extremamente plural, sintetizando vários estilos e escolas em um instrumentista só, além de criar suas próprias linguagem e identidade. Com Altamiro, todas as notas soavam com extrema limpidez e expressividade.
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