Em defesa dos músicos

musicosApós a decisão da não obrigatoriedade do diploma de jornalismo para exercer o ofício, mais uma profissão pode estar com os dias contados, no sentido legislativo. A ocupação em questão é a de músico.

“Numa democracia constitucional, não cabe ao Estado policiar a arte, nem existe justificativa legítima que ampare a imposição de quaisquer requisitos para o desempenho da profissão de músico. Se um profissional for um mau músico, nenhum dano significativo causará à sociedade”

No dia 14 último, a procuradora geral da República em exercício, Deborah Duprat, protocolou ação no Supremo Tribunal Federal (STF) questionando a lei 3.857/60, que instituiu a Ordem dos Músicos do Brasil (OMB), estabelecendo critérios para o exercício da profissão de músico no país.

No documento, Duprat pede uma liminar para suspender alguns dispositivos da lei, 22 artigos no total, e que, no julgamento definitivo, a legislação seja revogada pois entende que as restrições impostas são incompatíveis com a liberdade de expressão da atividade artística, prevista no artigo 5º, inciso IX, da Constituição Federal, e classifica a lei como inconstitucional.

“Numa democracia constitucional, não cabe ao Estado policiar a arte, nem existe justificativa legítima que ampare a imposição de quaisquer requisitos para o desempenho da profissão de músico. Se um profissional for um mau músico, nenhum dano significativo causará à sociedade”, argumentou no ofício a procuradora interina.

O fato é que o assunto vem gerando polêmica no meio musical. Isso porque a maioria dos músicos ouvidos pela reportagem critica a atuação da OMB, mas não defende sua extinção. A exceção é o rapper B Negão.

“Sou a favor da completa extinção do órgão. Acho que ele não faz sentido e ainda dificulta a vida de quem está batalhando para mostrar o seu trabalho. Não tenho nada contra as pessoas que lá trabalham, mas como instituição é horrível”, ataca B Negão.

Para o compositor Fernando Brant, o assunto é delicado e requer uma ampla discussão sobre o papel fundamental do organismo junto à classe musical. “O que o Ministério Público alega é que a regulamentação restringiu o acesso ao fazer musical. Acredito que muitos músicos deixam de expor seus trabalhos diante das questões impostas pela Ordem”, opina Brant.

No entanto, ele não é a favor da suspensão da lei 3.857/60 e, consequentemente, da extinção da OMB. “Se for para mexer em algo, que seja geral e não apenas em um ou outro dispositivo. Talvez seja uma oportunidade de ampliar o debate e, claro, melhorar o serviço do órgão, redefinindo seu papel diante da classe musical”, diz.

Se a ação do MP vem, em parte, ao encontro do interesse de toda coletividade musical, já não é de hoje que a OMB enfrenta uma série de ações jurídicas.

É o caso do advogado Renato Dolabella. Em 2006, ele e mais quatro músicos entraram com ação na Justiça mineira contra o órgão. Em duas instâncias, foram vitoriosos e o caso agora foi parar no STF. “Antes de exercer a advocacia, trabalhava como músico, cantando em bares e casas de show. Nossa ação questiona a atuação do órgão e seu papel no sentido de defender a classe”, afirma Dolabella.

Para OMB de Minas, ação poderá prejudicar interesses da categoria
Para o advogado do Conselho Regional de Minas Gerais da Ordem dos Músicos do Brasil (OMB), Giovanni Charles Paraízo, caso o Supremo Tribunal Federal dê parecer favorável à ação do Ministério Público, será um retrocesso e um prejuízo para a categoria. “A primeira consequência será que a profissão de músico cairá na informalidade”, diz.
Segundo ele, a maioria dos profissionais não sabe dos direitos e deveres determinados na legislação e entra na Justiça apenas para não pagar a anuidade. Ele acredita ainda que a ação da Procuradoria Geral é um tanto superficial.
“Como autarquia do Ministério do Trabalho, a OMB fiscaliza os contratos desses profissionais, observando, por exemplo, o devido recolhimento do INSS, entre outras questões. A OMB quer uma discussão ampla no sentido do que for melhor para a categoria. Existe o interesse e a necessidade de atualizar a legislação, mas não sua extinção”. (FC)

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