Quando se pensa em cultura, duas imagens nos vêm à mente: a da produção cultural material (como livros, filmes, artesanato) e a que nos identifica como um grupo de pessoas com valores compartilhados (alagoanos, corintianos, seres humanos). Para além dessa visão, a cultura interage com toda uma outra série de setores que permeiam a nossa existência – turismo, economia, sociedade, meio ambiente.
A percepção de que a cultura é a mola propulsora e o amalgama do desenvolvimento sustentável, é um fator de vantagem competitiva de vários paises. Em 1997, a Grã-bretanha desenvolveu uma ampla análise de estudo dos diferentes setores econômicos, tentando encontrar um substituto a indústria manufatureira nacional, cada vez mais combalida pela concorrência internacional. Foi justamente na cultura, através das indústrias criativas, que a Grã-bretanha lançou suas esperanças – e investimentos. Desde então, o setor tem crescido a um ritmo vertiginoso, garantindo o crescimento da economia. Entre 1997 e 2000, por exemplo, a taxa de crescimento das indústrias criativas foi de 7,9% do PIB, contra 2,8% da economia. Em 2000, o setor rendeu £ 8,7 bilhões em exportações. O desemprego, a grande praga que atinge a economia européia, também tem sido combatida através da cultura. Entre 1997 e 2001, o emprego nas indústrias criativas teve uma taxa média de crescimento de 5% ao ano, representando 1,95 milhão de empregos em 2000.
Esses dados impressionantes chamam a atenção para um setor no qual o Brasil tem um enorme manancial de matérias-primas. Nossa diversidade cultural, a criatividade do brasileiro, a vontade de compartilhar o que é nosso, o respeito (muito além da tolerância) pelo que é diferente, são traços distintivos nossos, reconhecidos e valorizados internacionalmente. Para que todo esse potencial se transforme em dados econômicos invejáveis, em um futuro não muito distante, é preciso começar a trabalhar agora!
Em primeiro lugar, é fundamental reconhecer a cultura em sua forma mais ampla, multifacetada e insubstituível, porque é essa riqueza de traços que faz dela o centro do desenvolvimento econômico de uma cidade, região ou país.
– Cultura como fator de consolidação de identidade.
– Cultura como fator de divulgação da imagem, regional e internacionalmente.
– Cultura como fator de aglutinação de comunidades e grupos.
– Cultura como fator de educação e inclusão social.
– Cultura como fator de promoção da diversidade.
– Cultura como fator de geração da mola propulsora da economia: criatividade e inovação.
– Cultura como fator de atração de mão-de-obra qualificada.
– Cultura como fator gerador de renda, emprego, impostos, infra-estrutura e riqueza.
– Cultura como fator de regeneração de uma região.
E tantos outros benefícios podem ser gerados. Mais do que um discurso que soa correto, há uma infinidade de exemplos práticos de iniciativas internacionais extremamente bem-sucedidos, para cada um dos tópicos acima. Até mesmo instituições racionais e céticas por excelência, como os bancos internacionais, curvaram-se recentemente à posição vital da cultura no centro dos programas de desenvolvimento. O próprio Presidente do Banco Mundial, James Wolfensohn, defendia já em 1999, que “Considerações culturais devem ser incorporadas em todos os aspectos do desenvolvimento, se quisermos que o desenvolvimento seja sustentável e efetivo. A cultura é um recurso subestimado nos países em desenvolvimento. Pode gerar renda, através de turismo, artesanato e outras empresas culturais. Além disso, o apoio às atividades culturais tem um profundo efeito no bem-estar, na organização social e no funcionamento da sociedade”. Em outras palavras, a cultura não só gera riqueza, como faz isso através da construção da auto-estima, da coesão social e da confiança na sociedade.
O segundo requisito fundamental para que a cultura sustente o desenvolvimento econômico-social é reconhecer suas interfaces com os outros setores. Com o turismo, porque o setor de turismo que mais cresce é o do turismo cultural. Com o meio ambiente, porque entender-se como parte de um mundo maior e respeitá-lo por isso é uma questão de valores e consciência, o que também se apóia na cultura. Com a área social, porque um povo que se entende como tal, que acredita em si e nos outros, que trabalha em conjunto com os outros e que tem formação é a cultura é um excelente fator de união e expressão desses sentimentos. Com a economia, porque as atividades culturais também são atividades econômicas – gerando renda, empregos, tributos, investimentos em infra-estrutura e desenvolvimento.
Sendo assim, a cultura não é um setor nem uma área, é um pedaço desse caleidoscópio no qual vivemos e que permeia o que somos, o que fazemos, como nos entendemos. O que produzimos, o que comemos, como nos comportamos, o que enviamos para fora do país. É por isso que devemos restituir à cultura o papel de centro de desenvolvimento sustentável que é seu por direito.
Ana Carla Fonseca Reis
Cultura e Mercado