Dominguinhos
No começo, José Domingos de Moraes, o Dominguinhos, ainda apelidado Nenê, tocava pandeiro no trio de irmãos Os Três Pingüins, ao lado de Moraes (sanfona) e Valdomiro (malê, uma espécie de zabumba). O grupo mirim exibia-se nas feiras e portas de hotéis de sua cidade, Garanhuns, Pernambuco, quando foi ouvido por Luiz Gonzaga. O rei do baião, no auge, encantou-se com Dominguinhos (então com sete anos, em 1948) e prometeu apadrinhá-lo se ele viesse para o Rio, o que só aconteceria em 1954. Radicado no subúrbio de Nilópolis, o filho de mestre Chicão, tocador e afinador de sanfonas de oito baixos (como Januário, pai de Gonzaga), ganhou uma sanfona do padrinho e formou com Miudinho e Borborema o Trio Nordestino. No refluxo do baião, que saiu de moda em meados dos 60, Dominguinhos foi obrigado a aprender outros gêneros musicais para tocar em gafieiras, churrascarias e boates. Apesar disso, ainda havia mercado para o gênero, acreditava outro sanfoneiro, Pedro Sertanejo (pai de Oswaldinho).
Em 1967, ele levou Dominguinhos para gravar discos instrumentais de forró em seu selo Cantagalo, no qual ele estrearia como solista e trabalharia também como acompanhante. Já no ano seguinte, formava dupla com Anastácia, que se tornaria sua esposa e parceira em clássicos como Eu Só Quero Um Xodó e Tenho Sede, êxitos na voz de Gilberto Gil, além de outros sucessos como De Amor Eu Morrerei, Lamento de Saudade, Saudade Matadeira e Forró em Petrolina.
Como Luiz Gonzaga (que o projetou no show Volta para Curtir, em 1972), Dominguinhos deve a virada em sua carreira ao incentivo e parceria com os baianos já na fase pós-tropicalista. Gal Costa levou-o para o festival MIDEM europeu no ano seguinte, participou do show Índia da cantora e de Refazenda de Gilberto Gil. Dominguinhos atuou também com Caetano Veloso e Maria Bethânia e abriu seu leque de parcerias (mais adiante com Guadalupe, sua segunda mulher), incluindo de Fausto Nilo (Pedras que Cantam) a Chico Buarque (Tantas Palavras, Xote da Navegação). Com o também pernambucano Nando Cordel, ele fez a toada lenta De Volta pro Aconchego, um estouro na voz de Elba Ramalho, e o forró Isso Aqui Tá Bom Demais, gravado em dupla com Chico Buarque. Com Gilberto Gil compôs entre outras Abri a Porta (sucesso do grupo A Cor do Som) e Lamento Sertanejo.
A parceria com o poeta Manduka, Quem Me Levará Sou Eu, ganhou o Festival da TV Tupi, em 1979, defendida por Fagner. Sua versatilidade como compositor – assinou também trilhas e temas musicais de filmes como O Cangaceiro (Aníbal Massaini Neto) e As Aventuras de um Paraíba (Marco Altberg) – equivale aos dotes torrenciais do músico.
A bordo do instrumento que o consagrou, Dominguinhos consegue ser melodioso até o lamento de dor ou incendiar um forró apinhado de dançarinos. Seu fole descende do mestre de todos Luiz Gonzaga, mas ele também é um criador com autonomia. Em sua longa discografia, ele compôs e gravou choros (Homenagem a Nazareth, Nosso Chorinho, Chorinho pra Guadalupe), além dos clássicos atemporais (A Maravilhosa Música Brasileira, 1982) e incontáveis temas para forró. Foi através de sua sanfona, aliás, que essa expressão antiga ganhou um conteúdo amplo e acabou abarcando vários estilos nordestinos (xaxado, baião, coco, quadrilha, entre outros). O célebre Forró do Dominguinhos que ele começou a praticar em shows para platéias universitárias espalhou-se pelo país e virou um gênero musical.
Tárik de Souza
A História da Música Brasileira Por Seus Autores e Intérpretes
SESC/TV Cultura