Ademar Casé, avô de Regina Casé, foi um pernambucano revolucionário que, de vendedor de rádios, transformou-se no principal comunicador brasileiro dos anos 1930 e 1940. Pioneiro do microfone, criou o primeiro programa comercial do Brasil. Foi o primeiro também a pagar cachê aos artistas, a fazer um contrato de exclusividade e a criar um jingle.
Essa é a figura que o documentário Programa Casé – O Que a Gente Não Inventa, Não Existe resgata para contar a história do rádio e da TV, além de mostrar a importância desses veículos para a música popular brasileira. De suas mãos saíram nomes como João Petra de Barros, Custódio Mesquita e Noel Rosa. Casé era amigo de Carmem Miranda, sócio de Francisco Alves e patrão do cantor e radialista Almirante.
Além de resgatar depoimentos do próprio, o documentário reúne ainda declarações de Silvio Caldas, Nássara e Carmélia Alves, além das últimas entrevistas concedidas por Dorival Caymmi e Braguinha, que canta uma música inédita.
Talvez esteja no DNA da atriz, comediante, apresentadora e entrevistadora Regina Casé o talento para as comunicações. Seu avô, Ademar Casé (1902-1993), é o que se pode chamar de visionário, que se tornou um dos pioneiros do rádio e televisão no Brasil, como mostra o documentário Programa Casé – O que a gente não inventa, não existe, que estreia em circuito nacional na sexta-feira.
Dirigido pelo premiado curtametragista Estevão Ciavatta (Nelson Sargento, 1998), marido de Regina, o filme é um resgate da história dessa figura das telecomunicações no país, cuja vida se confunde com a própria história do Brasil, por ter atuado num período de efervescência industrial e cultural.
Casé fez o primeiro jingle do país e o primeiro contrato exclusivo de artista, em um casting de rádio que incluía Noel Rosa – que apresentou ao Brasil –, Carmen Miranda, Almirante, Braguinha, Aurora Miranda, Lamartine Babo, Sérgio Caldas, Dorival Caymmi e sua futura mulher, Stella Maris. Foi também sócio de Assis Chateubriand, na década de 1950, no lançamento da televisão, para onde levou os macetes que inventou e aprimorou no rádio.
A espinha dorsal do filme está numa entrevista do próprio biografado recuperada dos arquivos do Museu da Imagem e do Som do Rio de Janeiro. Nela, Casé revê sua história e trajetória. As falas são ilustradas de forma rica, com imagens de arquivos de instituições e da própria família Casé.
Depoimentos gravados nos últimos dez anos pontuam o documentário e fazem uma ponte entre passado e presente. É em Programa Casé que estão as últimas entrevistas dos músicos Dorival Caymmi e Braguinha, mortos em 2008 e 2006, respectivamente. Curiosamente, em ambas, as respectivas esposas ganham destaque. É o caso de Stella Maris, mulher de Caymmi, que morreu menos de duas semanas depois do marido. Seu depoimento sobre a dificuldade de ascender na carreira de cantora na era do rádio é, ao mesmo tempo, trágico e divertido. “A mulher, antes de ser cantora, era mulher. Tinha que dar pra subir.”
Um dos responsáveis pelo formato da programação que a Rede Globo tem hoje, José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, aprendeu muito do que sabe observando Casé. É dele uma observação que ajuda a definir e refletir melhor sobre qual é o espírito da televisão no Brasil. “A TV brasileira é filha do circo, do teatro e do rádio, e não do cinema, como nos Estados Unidos.”
Como Regina e Ciavatta contaram no Festival de Cinema de Paulínia, em julho, algumas imagens que seriam usadas no filme tiveram de ser descartadas por conta do alto valor cobrado pelos direitos autorais, mesmo sabendo que o filme era de baixo orçamento. “Todo mundo acha que tudo no Brasil é Mickey Mouse e dá muito dinheiro”, criticou a atriz na época. Regina, aliás, disse que preferiu não assistir ao documentário até depois de pronto, para manter a “higiene” do casal.
Mesmo assim, os dez anos de pesquisa de Ciavatta estão na tela e são muito bem utilizados para o resgate dessa história que, apesar da participação e presença da família de Casé, nunca cai na armadilha de um filme institucional-familar. Ao fugir do didatismo, Programa Casé – O que a gente não inventa, não existe ganha um apelo universal e dialoga com qualquer plateia.
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