O Conselho Pleno da OAB Paraná aprovou por unanimidade na última sexta-feira (26) o posicionamento contrário aos projetos ligados ao Programa Escola Sem Partido que foram apresentados na Câmara dos Vereadores de Curitiba (CMC) e na Assembleia Legislativa do Paraná (Alep). O relatório, apresentado pelo conselheiro Anderson Rodrigues Ferreira, aponta inconstitucionalidade formal e material em diversos pontos.
A posição do pleno foi a de se posicionar pela inconstitucionalidade do PL 606/2016, que tramita na Alep e de ingressar como amicus curiae, também considerando inconstitucional o PL 005.00275.2017 da CMC, cuja tramitação está trancada.
Entre as inconstitucionalidades estão itens como vício de iniciativa; a geração de despesas sem dotação orçamentária; o desrespeito aos artigos 205 e 206 da Constituição Federal, que tratam do direito à educação e da liberdade de cátedra; e, ainda, o desrespeito à Carta de Direitos de San Salvador, tratado internacional que se refere mais detalhadamente à educação.
O relator observou ainda importância e o predomínio da pluralidade no ambiente escolar. “Ainda que se adote uma concepção de ensino tradicional em que se privilegie a transmissão do saber em detrimento da prática dialógica, a escola nunca deixará de ser um ambiente plural. É indubitável que a coexistência de diferentes ideias, conceitos e realidades nunca se dará de forma pacífica e monolítica, muito pelo contrário, o conflito é inerente ao ambiente escolar e nele se evidencia. Desta forma a escola nunca será campo neutro”, observou Ferreira.
“Há uma questão legal, o vício de iniciativa, que é da União. Aí está a primeira inconstitucionalidade. Depois, há a preocupação com o patrulhamento ideológico e punições subjetivas. É claro que o ensino deve ser amplo, com a demonstração de todas as linhas de pensamento, mas não se pode a título de neutralidade, exercer censura prévia sobre os professores, querendo avaliar o direito de opinião, dizendo o que pode e o que não pode ser dito em sala de aula”, avalia o presidente da OAB Paraná, Cássio Lisandro Telles. “A própria Constituição diz que o ensino deve ser ministrado com a liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber, bem como o pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas”, concluiu Telles.
Constitucionalidade
A Constituição Federal prevê que a educação é direito de todos e dever do Estado e da família, devendo ser promovida por toda a sociedade (art. 205). Além disso, o artigo 206 coloca entre os princípios do ensino a “liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber” e o “pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas”.
Para o relator, a maneira como é definido o papel do professor no bojo dos Projetos de Lei Programa Escola Sem Partido é “um manifesto afronte à liberdade de ensino e de consciência”, que “impede a atuação docente para a formação cidadã dos alunos”. Ferreira sustentou que é imprescindível que liberdade de cátedra vá além da escolha dos métodos didáticos a serem utilizados, passando pela seleção textos e obras serem estudados. “Logicamente, tais escolhas devem se pautar no conteúdo previsto em diretrizes educacionais e no pluralismo de ideias presente no campo específico do conhecimento, sem conter material que endosse preconceitos e discriminações”, observou.
O Programa Escola Sem Partido evoca a Convenção Interamericana de Direitos Humanos – Pacto de San José da Costa Rica para defender que os pais têm direito de que os filhos recebam educação de acordo com suas convicções morais e religiosas. Contudo, o relator traz o seguinte contraponto ao apresentar uma interpretação da Corte Europeia no caso Caso Kjeldsen, Busk Madsen e Pedersen contra Dinamarca: “A Corte Europeia a este respeito pronunciou-se no sentido de que o objetivo do dispositivo é ‘garantir o pluralismo educacional, essencial na preservação de uma sociedade democrática’ e que para tanto a interpretação do artigo deve ser no sentido de permitir que todas as religiões sejam respeitadas no ambiente educacional e não haja a imposição uma única religião”.
Além disso, o Brasil é signatário do Protocolo de San Salvador, que trata mais especificamente sobre o direito à educação “Nada do disposto neste Protocolo poderá ser interpretado como restrição da liberdade dos particulares e entidades de estabelecer e dirigir instituições de ensino, de acordo com a legislação interna dos Estados Partes”, diz o item 5 do artigo 13 dessa norma, grifado no relatório.
Vício de Iniciativa
A Constituição Federal prevê ser de competência privativa do Executivo propor ao Congresso Nacional projeto de lei que impactem na organização administrativa e orçamentária. Sob o ponto de vista da simetria, a CF deve servir de parâmetro para os estados e municípios. Logo, não poderia partir do Legislativo uma proposta que vai acabar impactando o orçamento. No caso do Projeto Escola Sem Partido que tramita na Alep, está prevista a fixação de cartazes que listem as proibições aos professores. Segundo o Ministério da Educação, no estado do Paraná, há 8.696 escolas municipais e 3.487 escolas estaduais. Se em média, a média é de 10 salas de aula, seria gerado o impacto de despesa com a produção e distribuição de mais de 120 mil cartazes.
“No caso, os Projetos de Leis sofrem de inconstitucionalidade formal, posto que há interferência na autonomia administrativa e cria despesas para o poder Executivo, sem indicação expressa de dotação orçamentária própria mas sua iniciativa não partiu do Governador do Estado ou do Prefeito Municipal, que é, precisamente, a exigência imposta pela parametricidade”, observa o relator.
Camila Kramer de Oliveira
Comunicação – OAB-PR
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