“O Último Dia de Yitzhak Rabin” estreou nos cinemas brasileiros nessa semana. Ideário sionista e antipalestino de Netanyahu está mais real do que nunca
Em O Último Dia de Yitzhak Rabin, longa-metragem de Amos Gitaï lançado nos cinemas brasileiros na semana passada, há uma cena que mostra israelenses em protesto nas ruas de Tel Aviv. Eles esbravejam contra os chamados Acordos de Oslo, firmados em 1993 por Israel e pela OLP (Organização para a Libertação da Palestina).
A manifestação ocorre em 1995, e o principal alvo do grupo era o então primeiro-ministro, Yitzhak Rabin, um dos poucos líderes israelenses a avançar em tratativas de paz com os palestinos. Os Acordos de Oslo previam o fim dos conflitos, a retirada de tropas do sul do Líbano e novas negociações sobre os territórios ocupados.
A cena avança e nos damos conta de que o Likud, partido da extrema-direita de Israel, está à frente do protesto. Manifestantes gritam a palavra de ordem “morte a Rabin”. O líder do ato (e do Likud) é Benjamin “Bibi” Netanyahu, que aparece discursando. Em sua opinião, era inadmissível que o governo confiasse no líder da OLP e presidente da Autoridade Nacional Palestina, Yasser Arafat.
“Estamos lutando pela paz verdadeira e duradoura, não por uma falsa paz”, declara Netanyahu, sob aplausos. “Estamos lutando pela expansão dos assentamentos judaicos, pela imigração judaica sionista – e não para que volte a lei palestina”.
Passados 28 anos, o ideário sionista e antipalestino de Netanyahu está mais real do que nunca, como se a cena do filme fosse um prenúncio do atual conflito israelense-palestino. Na segunda-feira (6), em entrevista à rede ABC News, o agora primeiro-ministro de Israel ameaçou “reocupar” a Faixa de Gaza após a destruição do Hamas. “Israel terá, por um período indefinido, a responsabilidade geral pela segurança, porque vimos o que acontece quando não a temos”, afirmou.
Voltemos a 1995. Rabin, de fato, foi executado naquele ano, não por um membro do Likud, mas pelo judeu ortodoxo e ultranacionalista Yigal Amir. O Último Dia de Yitzhak Rabin reconstitui os últimos momentos do primeiro-ministro e mostra como sua morte representou uma trava na busca pela paz. Em 1996, meses após o assassinato, Netanyahu se tornou primeiro-ministro de Israel pela primeira vez – ele está hoje em seu terceiro governo.
A inclusão das imagens da manifestação em Tel Aviv não é nada secundária, mas talvez precise de mais contextualização. O filme de Amos Gitaï, lançado internacionalmente em 2015, é melancólico e arrasador. Deixa uma mensagem desesperançada, segundo a qual o caminho para a paz se torna cada vez mais distante. O diretor, oito anos depois, se retrata: “Não posso me dar ao luxo de não ter esperança”. Gitaï não se rende a Netanyahu.
A estreia do longa no Brasil coincidiu com o conflito em Gaza, iniciado em 7 de outubro e marcado pelo genocídio dos palestinos, incluindo milhares de crianças. “Infelizmente, é o momento perfeito. Digo infelizmente porque é tão trágico – mas temos que manter a ideia de que ainda temos que lutar por uma solução”, analisa o diretor.
Para Gitaï, a política de Netanyahu deixa um rastro de “pessimismo, destruição, morte, niilismo”. Se não era a opção ideal, Rabin, vencedor do Nobel da Paz de 1994, talvez fosse a saída possível. O cineasta defende que, hoje, só o fim do governo Netanyahu, pode beneficiar tanto os palestinos quanto os próprios israelenses. “Temos que, no fim do horizonte, manter um pouco de esperança e trabalhar para isso. Não vai acontecer por si só.”
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