Capitania de incertezas

incertezasA reestruturação imposta pela nova gestão da Fundação Cultural Capitania das Artes, desde o término do período carnavalesco, vem chacoalhando os bastidores da instituição responsável pela condução dos rumos da política cultural no município. A Funcarte tenta se safar da recente fase conturbada, que culminou com a saída do jornalista Rodrigues Neto da presidência, mergulhando de cabeça em um mar de incertezas – onde até os funcionários estão à deriva. Nos corredores, à boca miúda, ninguém sabe ao certo a atual nomenclatura do cargo que exerce nem como ficará o funcionamento da autarquia após a concretização das mudanças, entre as quais figura a transferência da atribuição de realizar os principais eventos da cidade – São João, Natal e Carnaval – para a Secretaria de Turismo (Seturde).

 

Mudanças param projetos que deveriam estar em andamento na FuncarteSe a intenção for consumada, pois o assunto está na pauta de reuniões agendadas entre os titulares das duas secretarias e a chefe do executivo municipal, a Capitania irá perder boa parte de seu já escasso orçamento anual. “Em 2010, foi aprovado um orçamento anual de quase R$10 milhões para a Funcarte”, informou a consultora cultural Ilana Félix, ex-funcionária da Fundação e protagonista do imbróglio de assédio moral que atingiu em cheio o ex-presidente Rodrigues Neto.

 

Segundo Ilana, deste montante, um quarto cobre custos com manutenção e folha de pagamento; outro quarto é destinado aos três períodos festivos; e a metade restante é utilizada em ações culturais. “Gostaria de informar que, dentre as atuais atribuições da Funcarte, está a promoção desses grandes eventos. Estão previstas no Artigo 42 da Lei Complementar 109/2009, ou seja, antes de qualquer coisa ser definida, a lei precisa ser alterada e aprovada pela Câmara Municipal”, avisa. “O que está posto pela Lei Orgânica, só pode ser disposto por norma de uma mesma hierarquia”, explica. A consultora disse que está surpresa com a notícia, “pois foi a atual administração que aprovou essa estrutura”.

 

Antes de 2005, de acordo com Ilana Félix, quando Carnaval, São João e Natal eram promovidos pela Secretaria de Turismo, o orçamento anual disponível para a Capitania era era de R$ 990 mil. “No mínimo, o Conselho Municipal de Cultura deve ter sido consultado sobre essa mudança”, conclui.

 

Conselho de cultura

 

O cineasta Paulo Laguardia, membro do Conselho, afirma que não houve nenhum contato oficial: “Nosso mandato termina em agosto, e em maio, no mais tardar junho, estaremos organizando nova Conferência Municipal de Cultura. Se não elegermos uma turma bacana o feitiço pode se voltar contra o feiticeiro”, diz. Os produtores culturais Danielle Brito e Kaleb Melo, o músico Jorge Negão e Maciel Macilei, representante das quadrilhas juninas, completam o quadro de representantes da classe artística no Conselho.

 

Uma das atribuições do grupo é garantir o funcionamento do Fundo de Incentivo à Cultura – FIC, regulamentado em 2010 após 13 anos na ‘geladeira’: “Tivemos um breve período para receber sugestões de artistas e produtores interessados em melhorar o FIC, que este ano terá R$ 400 mil para contemplar projetos inscritos nos editais. Até a próxima segunda-feira (11) teremos a minuta do FIC 2011 fechada”, adiantou Laguardia. Em 2010, o FIC recebeu 44 inscrições e aprovou 17 projetos – selecionados em outubro, o prêmio do edital só foi pago cinco meses depois, em  fevereiro deste ano.

 

Atualmente, Paulo Laguardia está produzindo três documentários: um sobre os 100 anos do bairro do Alecrim; outro sobre o prefeito Djalma Maranhão; e o terceiro sobre o Sebo Vermelho –  “Inclusive, em 2009, o documentário sobre o Sebo Vermelho foi contemplado pelo prêmio William Cobbet de Audiovisual, edital lançado pela Fundação José Augusto. Como até agora ninguém recebeu, estamos entrando com ação na justiça contra o Governo para tentar receber os R$ 20 mil a que temos direito”, lamenta.

 

Sem renúncia fiscal, Lei Djalma Maranhão para

 

Além do FIC, a Capitania das Artes também gerencia o Programa Djalma Maranhão, lei municipal de incentivo que utiliza recursos oriundos do ISS e IPTU para promover projetos, patrocinados por empresas interessadas em trocar o recolhimento de impostos por Cultura. O que poderia ser um ótimo negócio, tem se tornado verdadeira pedra no caminho: “Está tudo tão confuso que o Programa Djalma Maranhão não existe formalmente na lei orgânica do município, onde são citados a existência do Fundo de Incentivo à Cultura – FIC e o funcionamento do Conselho Municipal de Cultura”, lamenta Scilla Gabel, recém exonerada do cargo de Secretária Executiva do Programa.

 

Gabel foi convidada para exercer outra função dentro da Funcarte, a de Gerente de Programas e Projetos Culturais, mas recusou por entender que o Programa Djalma Maranhão merece dedicação exclusiva: “Seria irresponsabilidade minha aceitar o acúmulo de funções. O Programa está completando dez anos em 2011 e corremos o risco de ver todo o trabalho inciado em 2001 ir para o ralo ”, disse. Scilla lembra que protocolou na Secretaria de Planejamento, sob o número 006526/2011-76, no dia 1 de fevereiro, processo relativo à renúncia fiscal, e até agora – segundo informações disponibilizadas no site da própria Sempla – o processo ainda não chegou ao gabinete do secretário Antônio Luna.

 

“A falta de interesse do poder público reflete na baixa inscrição de projetos e, conseqüentemente, na baixa captação: dos cerca de R$ 4 milhões autorizados em 2010 pela renúncia fiscal, apenas R$ 800 mil foi captado até o momento”, frisa. Os projetos tem até 18 meses para buscar patrocínio, depois desse período o projeto é arquivado. “Outro agravante é o convênio da Prefeitura com a Receita Federal, que exclui a participação de empresas que optaram pelo imposto Simples”, destaca. Desde a exoneração de Scilla, o Programa Djalma Maranhão está sem secretária Executiva e corre o risco de parar.

 

Em tempo, paralelamente ao receio dos funcionários em dar declarações oficiais, a reportagem da TRIBUNA DO NORTE vem tentando entrevistar o novo presidente da Capitania das Artes há pelo menos três semanas sem sucesso. Na manhã de ontem, a secretária do gabinete da presidência da Funcarte agendou encontro para próxima segunda (11), às 11h. Enquanto isso, o Teatro Sandoval Wanderley, no Alecrim, permanece fechado há quase dois anos; o Museu de Cultura Popular Djalma Maranhão fechou suas portas dia 5 de abril (vai permanecer o mês fechado para manutenção); o edital de Cultura Popular permanece com débito junto aos grupos Araruna (Rocas) e Lapinha (Vila de Ponta Negra) desde 2009; e equipamentos do Núcleo de Audiovisuais e Novas Mídias mofam esquecidos em um depósito úmido.

Yuno Silva – repórter

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