Dizer que o Festival Internacional de Curtas de Belo Horizonte é um evento audiovisual já consolidado e referencial dentro das mostras de cinema no Brasil é cair em clichê. Mas um clichê, quando bem trabalhado, pode ser grandioso – esta palavra que define a força que o festival vem ganhando ao longo dos anos.

 

Pois a oitava edição, que abre para convidados hoje à noite e ao público amanhã, traz a maior vitrine de exibição de curtas do Estado e uma das maiores do país. E danem-se os clichês. Serão mais de 180 filmes ao longo de dez dias de programação.

 

Nas 14 mostras, há 26 países representados, incluindo EUA, Canadá, Itália, França, Israel, Finlândia, Croácia, Taiwan e Eslovênia.

 

Do Brasil, há trabalhos de 11 Estados, entre eles Minas, São Paulo, Espírito Santo, Bahia, Pernambuco e Ceará. “O ponto fundamental do festival é mostrar para a comunidade essa variedade de curtas-metragens”, diz Geraldo Veloso, diretor e organizador do evento há quatro anos.

 

Ele enxerga a oportunidade do público assistir aos filmes e dos realizadores poderem exibir seus trabalhos justamente como uma “prestação de serviços”. “É um painel amplo para o cara que quer ser cineasta, para o cinéfilo, para os curiosos. É também espaço de troca de figurinhas e muito tititi na fila de espera dos filmes”, conta Geraldo, que relembra com entusiasmo um caso peculiar do ano passado.

 

“O diretor de um dos vídeos universitários me contou que conheceu a equipe de produção do filme dele no festival do ano anterior, enquanto aguardava para entrar na sala de exibição. É isso que nos dá orgulho: ver esses frutos sendo gerados aqui”, observa.

 

Apesar do coordenador assumir a falta de foco temático dos filmes selecionados (“a nossa cara é a pluralidade”), existem ao menos duas vertentes de peso na edição 2006: os vídeos e a animação.

 

Os primeiros são literalmente a grande revolução do ano. Pela primeira vez em sua história, o festival coloca o formato “vídeo” dentro das mostras competitivas, igualando-o à película.

 

“Vivemos atualmente um fenômeno audiovisual. Eu mesmo, como cinéfilo purista, resisti muito à paridade dos formatos e à imagem dita inferior do vídeo”, confessa Geraldo. “Mas hoje não penso mais assim. Acredito que nada seja pior no vídeo. É apenas diferente”.

 

A incorporação do vídeo à grade oficial foi sentida na quantidade de inscrições. Se em 2005, o número de interessados no festival foi de 422 trabalhos, os inscritos, na edição deste ano, atingiram a marca de 953 curtas.

 

Foram 569 brasileiros, dos quais acabaram selecionados 127 participantes, e 384 estrangeiros, com a peneira das comissões de seleção fechando em 50 a serem exibidos nos próximos dias.

 

Minas Gerais é um retrato desse salto quantitativo proporcionado pela abertura ao vídeo: 142 filmes do Estado se inscreveram, contra apenas 11 no ano passado.

 

“O vídeo tem a cara da experimentação, da liberdade, da videoarte. É importante que ele esteja ao lado da película para o espectador aprender a reconhecer as diferenças, o tipo de linguagem e as possibilidade de cada formato”, afirma Cláudio Constantino, presidente da Associação Curta Minas, grupo que estará presente no evento durante o Fórum Mineiro do Audiovisual, no dia 21.

 

“Há muitos elementos específicos do vídeo e da película, mas há, por vezes, um encontro dos dois. Os filmes costumam ter versões em vídeo e DVD para divulgação, e continuam sendo os mesmos filmes”.

 

Nesse ponto, Cláudio acredita que existe necessidade de se “adotar” o vídeo sempre que for possível, por conta de suas variadas possibilidades de exibição.

 

“Nem sempre um lugar possui projetor de película, e aí tudo precisa ser apresentado em vídeo. Os filmes realizados em digital têm essa vantagem de poderem passar em qualquer lugar, o que amplia a janela de exibição”.

 

Geraldo Veloso complementa: “Assistir a vídeos é um desafio estético. É acompanhar um novo elemento com vários recursos que a película não tem”. Márcia Valadares, membro do Centro de Estudos Cinematográficos e também coordenadora do festival, enxerga o vídeo como algo “fora da linguagem clássica, que pegou o abstrato para se expressar”.

 

“Estava mesmo na hora dessa junção com o curta, porque os dois trabalham universos fora do tradicional”, comenta.

 

Desenhos que movem

 

Outra linha que o festival vai seguir em 2006 é um retorno à animação. O gênero foi foco principal na edição de 2004 e agora volta literalmente à mesa de discussão. No sábado, acontece um encontro público com a Associação Brasileira de Cinema de Animação no Palácio das Artes.

 

Participarão animadores, professores, estudantes, cinéfilos e representantes de entidades do audiovisual, como a Associação Curta Minas.

 

“As facilidades de difusão do curta animado, inclusive com produção de filmes para celular, torna importante um debate sobre os caminhos que estão sendo seguidos, desde o âmbito da criação até a questão política, com a criação de grupos destinados exclusivamente a defender os diretores de animação junto a órgãos do governo e da iniciativa privada”, diz Cláudio Constantino.

 

Minas Gerais entra firme nesse caminhar da animação, graças à escola específica do gênero no curso de Belas Artes da UFMG. “O Estado está tendo grande participação em projetos mundiais, inclusive na produção industrial de longas animados dos EUA”, comenta Constantino.

 

“Em qualquer estúdio grande de animação do exterior, dá para encontrar um mineiro trabalhando”. E o presidente da Associação Curta Minas não fala isso em tom de brincadeira.

 

Geraldo Veloso, que incluiu na programação do festival uma mostra de produções animadas da França (a ser exibida no dia 28, às 18h30) e uma oficina prática, concorda com a visão de que o curta é o formato ideal para os desenhos que se movem.

 

“É um espaço privilegiado para o diretor fazer o que quiser com a sua criatividade”, decreta. E Geraldo adianta: está em negociação com a UFMG a exibição dos melhores curtas animados que participaram das oito edições anteriores do festival.

 

“Temos um acervo total de mais de 2.000 filmes. Desses, precisamos catalogar os animados e fazer uma curadoria. Seria um desmembramento do evento em parceria com a universidade”.

 

A difícil seleção do que ver

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