Evento, que fez parte da programação do Mês do Patrimônio, mostrou ao público todo o processo de descoberta e restauração da peça
Na sexta-feira, 29 de agosto, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) promoveu uma visita guiada à embarcação histórica encontrada em 2024, durante as obras do Parque Linear da Doca para a COP 30, em Belém. A atividade integrou a programação do Mês do Patrimônio, que neste ano teve como tema “Participação Social, Territórios e Sustentabilidade”, e aproximou a comunidade de um dos achados arqueológicos mais significativos da região.
O evento de educação patrimonial voltada para a população contou com mediação de especialistas em arqueologia, além da participação de profissionais em arquitetura e restauro e técnicos do Iphan. “Todas as equipes envolvidas são diversas, elas são multidisciplinares, então tem arquiteto, engenheiro, arqueólogo, restaurador, e eles foram explicando para a população o processo de como foi achado, de retirada, de manutenção, de conservação do bem, até o momento que a gente está hoje”, comentou o arqueólogo do Iphan no Pará, Augusto Miranda.
O barco, que mede cerca de 30 metros de comprimento, passou por um minucioso processo de restauração iniciado em fevereiro deste ano. Apesar do avançado estado de corrosão, parte do metal resistiu às intempéries, permitindo a recuperação da estrutura. O trabalho incluiu limpeza, estabilização e aplicação de produtos específicos para desacelerar o processo de deterioração e garantir a preservação futura.
Para Tainá Arruda, arquiteta e restauradora da empresa contratada para realizar o trabalho de restauro, o processo foi um desafio, pois a estrutura ficou muito tempo soterrada, sendo exposta a vários tipos de produtos químicos. “Foi feito inicialmente um tratamento de limpeza mecânica, com muito cuidado na remoção dos sedimentos, e depois uma limpeza com água de baixa pressão. Essas etapas e esse cuidado progressivo foi realizado justamente para ir compreendendo o estado da estrutura metálica da embarcação”.
Os estudos indicam que a embarcação pode ser do século 19 e que foi utilizada para o transporte de mercadorias, reforçando o papel do comércio fluvial na consolidação de Belém como cidade amazônica. Além da embarcação, foram encontradas louças, moedas e cerâmicas que ajudam a compreender o cotidiano e a diversidade de populações que habitaram a região, incluindo indígenas e comunidades negras.
Segundo a superintendente do Iphan no Pará, Cristina Vasconcelos, a embarcação é uma peça de extrema importância para a história da cidade. “Belém nasceu de frente para o rio e tem uma história de comercialização pelo rio. Essa embarcação possui um grande conteúdo arqueológico para a nossa cidade e vem justamente substanciar tudo aquilo que a gente já entende: Belém dos portos, Belém como cidade de comercialização pelos rios, Belém de igarapés, Belém de muitas histórias através das águas”, afirma.
“A gente tem aqui em Belém uma grande relação com os rios, especialmente nesses períodos de início da invasão e colonização. E até antes, a partir das populações indígenas. Então, esse barco traz à tona, a necessidade de nós discutirmos e entendermos que essas relações foram importantes para essas populações e pode também nos levar a novas outras fontes que possam traçar um panorama um pouco mais completo dessas relações”, complementa Kelton Mendes, arqueólogo da empresa de arqueologia contratada para o processo de restauro.
A embarcação foi descoberta em 12 de agosto de 2024, durante as escavações para a construção do Parque Linear da Doca, em Belém. O achado marcou o início de um processo de resgate arqueológico sem precedentes na região.
A primeira etapa ocorreu em 11 de dezembro de 2024, com a retirada da proa, que foi levada para o estacionamento de uma universidade particular, onde foi montado um laboratório de conservação e restauro para análise detalhada da estrutura. Em seguida, no dia 10 de janeiro de 2025, a equipe de arqueologia conseguiu retirar o segundo fragmento, transferindo-o para o mesmo local. Poucos dias depois, em 27 de janeiro, foi realizado o resgate do terceiro segmento, concluindo a fase de escavações acompanhada pelo Iphan e pela Secretaria de Estado de Obras Públicas (Seop).
Com os fragmentos devidamente transportados e estabilizados, em fevereiro de 2025 teve início o processo de restauração, dividido em várias etapas e conduzido por uma equipe multidisciplinar. Os trabalhos se estenderam até julho deste ano, quando a embarcação atingiu o estágio final de restauro.
Faça um comentário