Saudade do Rei Bola (um pouco de história do Carnaval de Curitiba)

Esta completando 36 anos um ato do prefeito Mauricio Fruet, pai de Gustavo Fruet que também foi prefeito de Curitiba. Foi em 1983 que de forma subversiva se apontou uma política para a felicidade em especial ao do carnaval. Carnaval, termo usado como sinônimo de folia, de alegria, de dias ou momentos felizes, aliados ou não à subversão de costumes. Adoro subverter.

A história tem a possibilidade de ser escrita pelos homens e mulheres na diversidade das suas
visões do mundo. Para mim, em verdade, carnaval é escola de samba. E quem vive ou viveu uma escola de samba não sofreu com a profunda busca de identidade.
Quem pertence a uma escola de samba ou agremiação carnavalesca tem endereço, raiz, deixa de ser alguém, como diria Caetano Veloso, sem lenço e sem documento.

Eu vivi este tempo de escolas de samba. Era um tempo em que alegorias, fantasias e até boa parte dos instrumentos, como pandeiros e tamborins, eram de fabricação doméstica; e no
qual o que valia era a participação comunitária. Nestas comunidades como a da Vila Capanema compareciam entre outros convidados ilustres, Mestre Maé da Cuíca, Chocolate, Glauco Souza Lobo, Homero Réboli (meu saudoso parceiro, amigo e compadre),  Laé di Cabral, Charrão, Mestre Libanio, Picolé, Ceguinho, Amauri, Fernando Lamarão, Pernambuco, Binho, Pelezinho, Mancha e Reinaldo de Carvalho, o Bola, já um grande percussionista.

O mundo do samba de Curitiba, como de resto no Brasil, se estruturava, realmente, como um universo à parte, com regras, usos, costumes e até um vocabulário peculiar. Nesse universo, as células principais eram as escolas, cada uma delas, por sua vez, surgidas em geral de núcleos familiares que as dirigiam e davam suporte.
Embaixadores da Alegria os Davilas (Delci e Edson), Dom Pedro Jubal e família, Mocidade Azul, Afunfa, Charrão e esposa Célia, Colorado, Ismael Cordeiro filhos e irmãos. Soma-se a este universo: Chocolate e Tia Hilda, Marlene e Amauri, Tia Nair Réboli, Marlene e seu Nego Dalvino, família Santos, família Brito, Julio Diabo, José Cadille e muitas outras que tomaram as escolas de samba como espaço-ação no mundo desigual e assim ali, naquele espaço existia entre nós a possibilidade concreta da felicidade.

Fiquei pensando, cá com meus botões, se os carnavais de ontem são iguais aos de hoje.

A conclusão? É claro que são. A festa nunca passa, não muda, vejam o caso de Garibaldes e Sacis no carnaval de hoje,  tem sempre o mesmo significado, mas o que realmente muda são as pessoas, a maneira de brincar o carnaval, de se esbaldar no samba, de vibrar com as cores da sua escola (saudade da Escola de Samba Colorado – Vila Tassi ou Capanema) fazendo bonito no asfalto negro, palco das historias de enredos e sambas.

Fui um solitário nestas coisas de divulgar e promover o carnaval de Curitiba e principalmente quando o assunto era escola de samba, mas vesti acho, com dignidade a fantasia que me
couber pra atravessar a avenida das palavras (e composições que criei) em ritmo de telecoteco, balacobaco e ziriguidum.

A festa do carnaval continua a mesma, porém estamos vendo os valores sendo pervertidos. Já mudaram até o gordinho do Rei Momo. Pode uma coisa dessas? O Rei Momo tem de ser
magrinho por causa da saúde – coisa de: politicamente correto – não que eu defenda a obesidade, mas onde está o lúdico de quem vive o carnaval?

Sempre fui um crítico das políticas culturais da administração municipal com relação às escolas de samba, o nada de sempre que se toma para levar um pouco de diversão e dignidade
às escolas de samba locais que, aos trancos e barrancos, se arrumam como podem para desfilar. Despejaram o carnaval no meio do ralo interminável da indústria cultural e o transformaram apenas em mais um período do ano com algumas festividades.

Nem sempre foi assim.
Lembrei outro dia do meu velho e saudoso amigo Mauricio Fruet.

Cláudio Ribeiro, Glauco S. Lobo, ? e Mauricio Fruet

Mauricio, então prefeito de Curitiba, já vai tempo e tome tempo, atendendo a um pedido meu (era o presidente da Associação das Escolas de Samba) e de Glauco Souza Lobo (partiu recentemente), seu diretor da Fundação Cultural de Curitiba, assinou um decreto nomeando (sem concurso) Rei Momo do Carnaval de Curitiba o grande Reinaldo de Carvalho o Rei Bola.

Oficializou o gordo, simpático e comunicativo << Bola >> como o Rei Momo de Curitiba,
dispensando qualquer eleição. O mais competente Rei Momo que o carnaval curitibano já teve. Foi há 36 anos!

A história do Rei Momo é mais uma contribuição da mitologia grega. Segundo a lenda, Momo era o deus da galhofa, dos delírios, adorava uma festa, mas fazia tanta bagunça que acabou
expulso do Monte Olimpo. E veio parar justamente no Brasil, mais precisamente em Curitiba, cidade tida como a capital que não tem carnaval!

O Rei Bola era simpático, agitado, bonita voz, conhecendo todo o repertório de marchinhas e sambas carnavalescos, foi responsável por grande parte da alegria no carnaval de Rua de Curitiba na década de 80. Foi, ao lado de Homero Réboli, Nelson Santos e Carlos Mattar, meu parceiro em inúmeros sambas. Durante muito tempo, pertencer ao seleto grupo de compositores de uma escola de samba era um privilégio e uma honra. Assim, fui da Ala de Compositores da Mangueira do Rio de Janeiro, como a de inúmeras outras aqui de Curitiba.

Vencedor como interprete por duas vezes do Festival Abre Alas, um concurso de músicas de carnaval que criei, coordenei e apresentei pela Secretaria de Estado da Cultura. Bola adorava cantar.

Bola vai ao Rio de Janeiro, depois de ser por anos nosso Rei Momo e lá obtém grande prestigio sendo coroado nos seguintes anos: 1987, 1988, 1989, 1990, 1991, 1992, 1993, 1994,
1995. Nenhum foi rei como Reinaldo de Carvalho, o Bola – o mais famoso dos momos que já desfilaram na cidade do Rio de Janeiro.

Bola morreu em 1995 e até hoje é lembrado com carinho.

Existe em Curitiba uma rua que leva seu nome: Rua Reinaldo de Carvalho (Bola) localizada no bairro de Ganchinho.

Bola sabia que para a felicidade, como para tudo na vida, é preciso se libertar, se plenificar para o prazer. E como tinha prazer estar ligado ao samba e ao carnaval. Sambava lindo que só vendo mesmo com seus 265 quilos!

Só pode experimentar a felicidade aquele ou aquela que se liberta da submissão.

Se nos é possivel o acesso ao mundo da felicidade, se esta é uma opção que esta à nossa frente, o minimo que podemos fazer é buscá-la como fez com sua alegria o Rei Bola: de forma subversiva sem submissão no carnaval!

Cláudio Ribeiro

Jornalista-Compositor

Ouça aqui a primeira gravação do Carnaval Curitibano – Atenção: para ouvir pare o som da web radio Brasil Cultura.

Sambicura da galinha – Nair Pereira dos Santos – Canta Reinaldo Bola

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2 Comentários

  1. Participei de um Concurso de Variedades Artísticas do Senai…Eu era aluno…Não me lembro em que ano foi. Mas era na Rua Chile. Inscrevi uma música (Maris e Mar) e lá estava nosso querido e saudoso Bola. Ele também estava participando com uma Bandinha. Saudade !!! Muita saudade!!!

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