História do Choro 2

 

Choro

O choro pode ser considerado como a primeira música urbana tipicamente brasileira.

Os primeiros conjuntos de choro surgiram por volta de 1880, no Rio de Janeiro —antiga capital do Brasil—, nascidos nas biroscas do bairro Cidade Nova e nos quintais dos subúrbios cariocas.

Esses grupos eram formados por músicos —muitos deles funcionários da Alfândega, dos Correios e Telégrafos, da Estrada de Ferro Central do Brasil—, que se reuniam nos subúrbios cariocas ou nas residências do bairro da Cidade Nova, onde muitos moravam.

O nome Choro veio do caráter plangente e choroso da música que esses pequenos conjuntos faziam. A composição instrumental desses primeiros grupos de chorões girava em torno de um trio formado por flauta, instrumento que fazia os solos; violão, que fazia o acompanhamento como se fosse um contrabaixo —os músicos da época chamavam esse acompanhamento grave de “baixaria”—; e cavaquinho, que fazia o acompanhamento mais harmônico, com acordes e variações.

Esse tipo de música também era conhecida na época como pau-e-corda, porque as flautas usadas naquele tempo eram feitas de ébano. O choro foi o recurso que o músico popular utilizou para tocar, do seu jeito, a música importada que era consumida, a partir da metade século 19, nos salões e bailes da alta sociedade. A música que os chorões tocavam, porém, logo se distinguiu em muito daquelas tocadas no nobres salões cariocas.

As primeiras referências ao organizador desses conjuntos de pau-e-corda citam o flautista Joaquim Antônio da Silva Calado, ou apenas, Calado.

Calado tinha grandes conhecimentos musicais e conseguiu reunir em torno de si os melhores músicos da época, os quais tocavam pelo simples prazer de fazer música. O repertório dessas bandas incluía polcas, xotes, tangos e valsas. Entre a turma de Calado estavam nomes como Viriato Figueira da Silva, Patola, Saturnino, Luizinho e Silveira. Todos craques em fazer, propositalmente, modulações complicadas com intuito de “derrubar” os outros músicos.

O choro é marcado pelo ardil de seus participantes para derrubar aquele que esteja se saindo mais buliçoso, mais irrequieto que os outros. O choro é uma música feita de arquétipos que exigem do músico muito domínio de seu instrumento e uma apurada percepção de códigos e senhas que se encaixam em gigantescos improvisos.

O nascimento do choro e dessa sua fórmula de improvisação é 50 anos anterior ao jazz, no entanto, se constrói da mesma forma que a música negra norte-americana, ou seja, é feito como se fosse um jogo criativo executado com muita habilidade e genialidade.

Portanto, o tão falado improviso jazzístico já existia no Brasil dos tempos do Império. A construção inconfundível do choro é marcada pelo tema, as harmonias e as modulações, que são moldados por um acompanhamento rítmico, armado malandramente para testar o senso polifônico dos músicos e sua capacidade de improvisar em uma construção musical extremamente móvel.

Esses primeiros músicos improvisadores encontravam-se completamente ao acaso e não tinham nenhuma regra para o número de figurantes ou para o tipo de composição instrumental. Por causa desta informalidade o choro é hoje feito com a participação de vários tipos de instrumentos. O que determinava a maneira como cada instrumento iria participar na música se dava em função da destreza do músico que o tocava, ou seja, não importava se fosse uma cavaquinista ou trombonista quem estava solando na música, o que importava era se ele era suficientemente hábil para fazer os solos.

Isso fez com que o bom músico de choro tivesse como condição básica ser também um bom improvisador. No século seguinte, essa música criada por instrumentistas populares cariocas que eram em sua maioria mestiços em processo de ascenção social, revelou, entre outros, grandes artistas como Sátiro Bilhar, Dino e João Pernambuco (três excelentes violonistas); Lula Cavaquinho e Nelson Alves (cavaquinho); Patápio, Pixinguinha e Altamiro Carrilho (mestres da flauta) e Jacó do Bandolim.

Com o advento do cinema mudo com orquestra na sala de espera, da industria fonográfica e do rádio, esses músicos passaram a se profissionalizar e não precisavam mais trabalhar em empregos públicos como os primeiros chorões. Entretanto, havia instrumentistas como Donga que conservaram a atividade extra-musical. Donga era violonista e oficial de justiça.

Hoje, músicos, entre outros, como Paulinho da Viola, Paulo Moura, Isaías, Hamilton de Holanda, Hélio Delmiro, Turíbio Santos e também os conjuntos Época de Ouro, Água da Moringa, Trio Madeira Brasil, Premeditando o Breque, Galo Preto e muitos outros, mantêm em atividade essa manifestação instrumental popular que os grandes centros urbanos do Brasil produziram e produzem.

Aliás, foi induzido por essa música que Villa-Lobos criou uma de suas mais importantes composições, intituladas “Os Choros”.

Renato Roschel

 

 

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