BANDEIRANTES E ESPANHÓIS NO GUAIRÁ NOS SÉCULOS XVI E XVII

ÍNDIOS, JESUÍTAS, BANDEIRANTES E ESPANHÓIS NO GUAIRÁ NOS SÉCULOS XVI E XVII

Este artigo analisa o papel dos índios, jesuítas, bandeirantes e espanhóis no Guairá, durante os séculos XVI e XVII, isto através da discussão das expedições que percorreram a região e das diferentes posições que assumiram esses personagens. Assinalando que não é possível reduzir essas relações a simples perspectivas dicotômicas.

Palavras-chave:
Índios, jesuítas, Guairá. Abstract 

A princípio tudo representava um panorama selvático. O seio da terra virginal, recoberto de florestas seculares, abrigava tesouros inestimável de fecundação e fertilidade prontos para fornecerem colheitas dadivosas (….) Havia, de primeiro, a terra protegida pela floresta imensa. E lentamente a floresta, a floresta tão exuberante e impenetrável cedia lugar àqueles homens intrépidos e valentes.

 

Frases como essas, de diferentes autores, são comuns nos escritos, oficiais ou não, sobre o norte e outras regiões do Paraná reocupados pela sociedade nacional e paranaense nos séculos XIX e XX

Construiu-se a ideologia de que esses territórios indígenas estavam vazios, desabitados e prontos a serem ocupados. Essa construção ocorreu dentro dos marcos da expansão capitalista que incorporou essas novas áreas ao seu sistema de produção.

Os agentes dessa construção são muitos: desde a história oficial das companhias colonizadoras; os discursos governamentais; os escritos que fazem a apologia da colonização; os geógrafos que escreveram sobre a ocupação nas décadas de 30 a 50 do século XX; a historiografia paranaense produzida nas universidades e, por fim, os livros didáticos que, se utilizando dessas fontes, repetem para milhares de estudantes do Estado a idéia de que as terras indígenas do terceiro planalto do Paraná constituíam um imenso “vazio demográfico” pronto a ser ocupado pelos pioneiros. Com isso retira-se, elimina-se propositadamente da história regional as populações indígenas que aqui viviam e resistiram a conquista de suas terras e a destruição de seu modo de vida.

Recolocando as populações indígenas enquanto sujeitos ativos da história, percebemos que os territórios localizados entre os rios Paranapanema, Tibagi e Ivaí, hoje denominados de Norte e Noroeste do Paraná, foram ocupados, desde tempos imemoráveis. E desde a chegada dos brancos europeus no novo continente iniciou-se a guerra de conquista contra as populações indígenas que aqui viviam. Guerra entendida no sentido dado por Antônio Carlos de Souza Lima: um processo que requer uma organização militar conquistadora que age em nome de um Deus, uma Nação, um Rei, Império, etc; um povo de onde se origina o conquistador e que lhe dá uma identidade social e uma direção comum; e o botim, composto pelo povo conquistado com seus territórios e riquezas que são mercantilizadas. E conquista, quando parte do povo conquistador fixa nos territórios conquistados; fazem a exploração sistematizada do butim e passam a veicular os elementos básicos da cultura invasora através de instituições concebidas para tanto.

A guerra de conquista iniciou-se nas primeiras décadas do século XVI com as expedições portuguesas e espanholas que cruzaram a região em busca de metais, escravos, e de uma rota ao Paraguai e Peru. Acentuou-se no seiscentos com a implantação das Reduções Jesuíticas no Guairá e com as bandeiras paulistas que invadiram a região capturando índios. Prosseguiu no século XVIII com a descoberta de ouro e diamantes no rio Tibagi e com as expedições militares que construíram fortificações e transitavam pelo território rumo ao Mato Grosso. Recrudesceu no novecentos com a ocupação das terras da bacia norte do rio Tibagi, e a partir da segunda metade do século XVIII, com a invasão dos campos do cacique Kaingang Inhoó, pelos grandes fazendeiros dos Campos Gerais paranaense na expansão de seus domínios. No século XX a guerra de conquista continuou sob o manto da “colonização pacífica e harmoniosa”, levada adiante pelas companhias de terras que ocuparam, lotearam e venderam os antigos territórios indígenas com o aval institucional do Estado do Paraná.

1.1. As expedições que cruzaram os territórios indígenas no século XVI

Os contatos dos brancos europeus com os grupos indígenas que habitavam a região ocorreu no início do século XVI, com as primeiras expedições portuguesas e espanholas que passaram pelo Guairá rumo ao Paraguai e ao Peru para reconhecer o interior dos seus territórios, em processo de conquista e guerra contra os indígenas.

Em 1522 Aleixo Garcia empreendeu a primeira viagem terrestre de europeus pelo interior do sul do Brasil. Além do reconhecimento, tinha por objetivo descobrir as regiões de onde proveriam o ouro encontrado na costa de Santa Catarina. A expedição, que durou aproximadamente 3 anos, partiu do litoral de Santa Catarina, passando pelos territórios dos Guarani – hoje Paraná, Paraguai e Bolívia – até alcançar a fronteira do império Inca. No retorno Garcia foi morto pelos Guarani nas proximidades de Foz do Iguaçu, por volta de 1525. Todas as informações sobre esta expedição são indiretas, baseadas em relatos de outros cronistas dos séculos XVI e XVII. É possível, pois ainda não há informações suficientes, que a expedição de Garcia tenha seguido um trajeto parecido ao que fez o adelantado Cabeza de Vaca na década de 1540.

Poucos anos depois, em 1531, visando retomar os reconhecimentos empreendidos por Aleixo Garcia, partiu de Cananéia uma expedição liderada por Pero Lobo, com oitenta portugueses e diversos índios da costa (possivelmente Tupinambá). É provável que a expedição tenha seguido o caminho previamente percorrido por Garcia. A expedição, ao alcançar o rio Paraná nas proximidades de Foz do Iguaçu, também foi aniquilada pelos Guarani.

Dez anos depois Alvar Nuñez Cabeza de Vaca, após várias aventuras na América do Norte, veio tomar posse e comandar a província do Paraguai em nome do rei da Espanha. Desembarcou na ilha de Santa Catarina e, no final de 1541, partindo da foz do rio Itapucu, rumou para Assunção no Paraguai, onde chegou quatro meses depois acompanhado por 250 arcabuzeiros e balesteiros. Durante a expedição foi acompanhado por centenas de índios Guarani – a cada novo território que ingressava a expedição dispensava os acompanhantes do território anterior e, mediante pagamentos em espécie (machados, contas, etc.) integrava contingentes das terras que iam adentrando. Subiram a Serra do Mar, alcançaram o rio Negro (na altura de Rio Negrinho – SC ?) e desceram até a sua desembocadura no rio Iguaçu. Para contornar o território dos Kaingang tiveram de subir o Iguaçu e, a certa altura (Palmeira?), por terra, se dirigiram ao rio Tibagi, seguindo seu curso. Nas proximidades da foz do Iapó, atual cidade de Tibagi, a expedição dirigiu-se para leste até chegar ao rio Ivaí e, a seguir, rumando ao sul, passou pelo rio Piquiri até alcançar o rio Iguaçu, a poucos quilômetros de sua foz. Dali seguiram até Assunção.

O relato de Cabeza de Vaca é importante na medida em que descreve, ao longo de sua expedição, o contato e a entrada em territórios pertencentes a diferentes grupos Guarani. Foi o primeiro documento a informar que quase todo o interior do Paraná estava habitado e, ao mesmo tempo, mostrar que havia uma divisão política entre esses diversos grupos de mesma matriz cultural, organizados politicamente em cacicados (conjunto de aldeias sob a liderança de um prestigioso cacique, que dominavam certas porções de territórios bem definidos). Ao mesmo tempo, ainda que indiretamente, devido a imensa volta que a expedição fez pelos inter-flúvios do interior, também dá uma noção da extensão do território dominado pelos Kaingang, no médio Iguaçu e nos Koran-bang-rê (Campos de Guarapuava).

Em 1544, Domingos Martínez de Irala saiu de Assunção e veio ao Guairá apresar índios para as encomiendas. Fundou a cidade de Ontiveros junto ao rio Paraná, pouco acima da foz do Iguaçu. No início da década seguinte, 1551, Diego de Sanabria viajou pelo mesmo itinerário de Cabeza de Vaca. Ainda nesse ano, Cristoval de Saavedra atravessou a região vindo do Paraguai até o porto de São Vicente em São Paulo. No ano seguinte Hernando de Salazar, também fez o mesmo roteiro de Assunção no Paraguai até o porto de São Vicente em São Paulo. Esse roteiro também foi o percorrido por Ulrich Schmidl, nesse mesmo ano. Ele partiu de Assunção em 1552, acompanhado de 20 Índios Carijós com destino ao porto de Santos, onde chegou em 1553.

Ruy Dias Melgarejo, em 1553/1554 percorreu duas vezes o interior do Estado, desde de Ontiveros até São Vicente e regressou em 1555 partindo do litoral, em Santa Catarina, seguindo o mesmo roteiro de Cabeza de Vaca (Melgarejo participou em 1541 da expedição de Cabeza de Vaca). Ele teve um destacado papel entre os conquistadores espanhóis no interior do Paraná, pois conduziu a fundação de Ciudad Real (foz do rio Piquiri, município de Terra Roxa) e da 2a fundação de Villa Rica del Spiritu Santo (junto a foz do rio Corumbataí, município de Fênix, hoje Parque Estadual de Vila Rica do Espírito Santo).

O ano de 1555 foi marcado por várias ocorrências nesses territórios. Francisco de Gambarrota veio do Paraguai até o porto de São Vicente em São Paulo. Nuflo Chaves saiu de Assunção para combater e apresar índios no Guairá e, Rodrigo de Vergara chegou ao Guairá para iniciar a uma segunda cidade denominada Ciudad Real nas imediações da foz do rio Piquiri no Paraná. Em 1555 foi a vez Juan de Salazar e Cipriano de Góes fazer o caminho inverso partiram de São Vicente para o Paraguai.

Em 1588 os padres Manuel Ortega, Juan Saloni e Thomas Fields percorreram a região do Guairá visando conhecer o potencial humano para futuros trabalhos missionários, a exemplo do que já ocorria na costa do Brasil desde 1549. Informaram aos seus superiores a existência de milhares de índios Guarani na região, bem como reconheceram uma série de peculiaridades culturais, sociais e políticas que seriam úteis alguns anos depois. Era o início das atividades religiosas no Guairá, onde os conquistadores passaram a veicular os elementos básicos da sua cultura através dos padres jesuítas.

Enquanto isso a guerra de conquista continuou por seus meios tradicionais. Muitas vezes os conquistadores foram derrotados, como em 1601, quando Hernán Arias de Saavedra combateu contra os índios de uma parte do Guairá e foi derrotado pelos guerreiros de Guairacá. A exploração das populações indígenas pelos conquistadores não foi sem obstáculos como afirmam muitos autores, e a conquista dos seus territórios também não ocorreu de forma pacífica. Em todos os momentos, e por várias etnias, a resistência foi renhida e sangrenta. O território do Guairá, que compreendia parte da região norte e todo o noroeste do Paraná, foi local de trânsito de portugueses e espanhóis que iam e vinham de Assunção em direção as vilas do litoral brasileiro e, palco de guerras variadas e constantes. A conquista desses territórios indígenas foi feita palmo a palmo com o uso da espada, do arcabuz, da besta, da cruz, de doenças e de acordos. Alianças foram estabelecidas e rompidas e, de ambas as partes, fidelidades foram sacramentadas e traições meticulosamente planejadas.

1.2. Índios, padres, fazendeiros espanhóis e paulistas no Guairá

No limiar do seiscentos os portugueses chegaram na região em busca do seu butim: escravos indígenas para o trabalho nas fazendas paulistas, metais preciosos e outras riquezas. Porém, desde a fundação de São Vicente eles já preavam os Guarani do litoral e da encosta das serras paranaenses

Em 1602 Nicolau Barreto desceu o rio Paraná passando pelo Guairá, rumo às minas de Potosi no Peru. Em 1607, Pedro Franco de Torres, mais um viajante que atravessou a região rumo ao Paraguai, fez o roteiro já conhecido desde meados do século XVI. Nesse mesmo ano Manuel Preto, um dos maiores preadores de índios da época, dirigiu uma bandeira para o aprisionamento dos índios Guarani nas proximidades da cidade espanhola de Vila Rica do Espirito Santo. Procurando medidas estratégicas para conter as investidas portuguesas contra o “seu butim”, em 1608 o Rei da Espanha criou a Província del Guairá, abrangendo os territórios indígenas a leste do rio Paraná. Ignorando as medidas protecionistas da coroa espanhola, em relação as riquezas do Guiará, Manuel Preto voltou a esta região em busca de mais índios nos anos de 1611, 1618, 1623 e 1628, nessa ultima campanha acompanhado por Raposo Tavares. Seu fim foi a morte por ferimentos de flechas em plena campanha de aprisionamento de índios.

As primeiras décadas do século XVII foram marcadas por uma intensificação das ações dos europeus no Guairá. De um lado tivemos os choques entre índios e encomendeiros espanhóis, que exploravam o trabalho escravo na coleta da erva-mate. Os padres jesuítas em sua pregação religiosa tentavam inculcar os valores da sociedade invasora junto as populações indígenas existente na região. Contrariando os interesses dos encomendeiros espanhóis e dos padres da Companhia de Jesus tivemos os paulistas que vieram diversas vezes ao Guairá, em busca de seu butim. De uma perspectiva oposta os índios faziam uma leitura própria da conjuntura, resultando eventualmente em alianças, acordos e guerras, complicando o entendimento sobre os fatos ocorridos nas relações deles com os invasores de seus territórios. Disso resulta que a análise histórica da ocupação da região não pode ser dicotômica: índios contra brancos. Deve-se considerar os grupos conquistadores europeus e seus interesses localizados; bem como os Guarani e os Kaingang, que eram inimigos e, que estrategicamente, estabeleceram alianças entre si. Alianças explícitas ou não, o fato de que em determinados momentos um grupo indígena podia procurar as reduções, mesmo sendo refratário a pregação missionária, podendo significar apenas uma tática política momentânea para se livrar dos invasores paulistas ou do trabalho escravo nas encomiendas espanholas.

Os padres da Companhia de Jesus fundaram junto com os índios 14 Reduções nos vales dos rios Paraná, Iguaçu, Piquiri, Ivaí, Paranapanema e Tibagi. Instaladas no vale do Paranapanema estavam as Reduções de Nossa Senhora do Loreto e Santo Ignácio. No vale do Tibagi se localizavam São José, São Francisco Xavier, Encarnación e São Miguel. Na margens do Ivaí ficavam Jesus Maria, Santo Antônio e São Paulo; no rio Corumbatai foram instaladas São Tomas e a dos Sete Arcanjos. Nas cabeceiras do rio Piquiri implantaram São Pedro e Concepção; no médio Piquiri, Nossa Senhora de Copacabana. Todas foram destruídas pelas invasões dos bandeirantes paulistas no final da terceira década do século XVII. A comunicação das Reduções das margens do Paranapanema com as localizadas ao sul na região dos rios Corumbatai e Ivaí, ou vice-versa, podiam ser feitas subindo o rio Pirapó, até os ribeirões Maringá-Mandacaru, Morangueira ou Sarandi, e por estes chegar até o platô onde está Maringá, para descer pelos córregos Borba Gato, Cleópatra e Mascado ate o ribeirão Pingüim e por este até o rio Ivaí, em direção à cidade espanhola de Vila Rica do Espirito Santo ou às Reduções do Ivaí e Corumbataí. Uma outra rota possível seria subir o rio Pirapó até suas cabeceiras no rio Dourados, até alcançar o platô onde está Mandaguari e descer pelo rio Keller até o Ivaí. Com toda certeza essas rotas eram conhecidas e utilizadas pelos índios e delas se aproveitaram os padres jesuítas nas suas andanças e pregações nas aldeias da região.

Mas os bandeirantes paulistas também transitaram intensamente na região, e com toda certeza pelos caminhos e trilhas dos índios até 1640, quando destruíram as Reduções Jesuíticas do Guairá. Os paulistas foram responsáveis pela primeira construção militar no vale do rio Tibagi. Em 1628, Antônio Raposo Tavares e Manoel Preto, ao atacarem o Guairá, construíram um forte ou campo entrincheirado na margem esquerda do Tibagi, provavelmente no município de Ortigueira nas imediações de Natingui. O padre Maceta se refere a ele como ponto de apoio ou quartel de inverno dos bandeirantes “una palisada fuerte de palos, cerca de nuestras aldeas”.

Destruídas as Reduções Jesuíticas as populações indígenas se dispersam, parte foi para o sul junto com os padres fundar os sete povos das missões no Rio Grande do Sul, outra parte voltou a reocupar seus os antigos territórios. Mas a região não deixou de ser um atrativo para os paulistas tentarem aumentar seu butim. A partir de 1651 Fernão Dias Paes Leme ficou por três anos na região da Serra da Apucarana, e submeteu os caciques da nação Guaianá, ancestrais dos Kaingang, levando-os prisioneiros para São Paulo com todo o seu povo. Pedro Taques na Nobiliarquia Paulistana, relata essa expedição: Penetrou Fernão Dias Paes o sertão do sul até o centro da serra de Apucarana, no reino dos índios da nação Guyanãa, pelos annos de 1651; nelle existiu alguns annos, tendo estabelecido arraial com o troço das suas armas, para vencer a reducção daquelle reino, que se dividia em três differentes reis. (…) Poz-se em marcha o grande corpo daquelles reinos e todos seguiam gostosos esta transmigração debaixo do commando inteiramente do seu conquistador e amigo Fernão Dias

 

Mapa da região do Guairá onde foram instaladas as Reduções Jesuíticas. In: Jaime CORTESÃO. Jesuítas e Bandeirantes no Guairá. Rio de Janeiro, 1951. (Foto 1: Lúcio T. Mota, 1995)

Esse fato ainda requer estudos mais aprofundados, pois certamente os índios não seguiram gostosos o “amigo” Fernão Dias. O paulista invasor teve de permanecer vários anos na região, estabelecendo um arraial; provavelmente um local fortificado aos moldes do construído em 1628 por Raposo Tavares para conter o ataque dos índios. Taques fala em cerco imposto por Fernão Dias às plantações desses índios. Também fala de três caciques, Tombu, Sondá e Gravitay. Este ultimo morreu antes da partida para São Paulo; Sondá morreu na marcha (podemos sugerir a hipótese de que teria havido uma resistência desses caciques em seguir o bandeirante). Apenas o primeiro, Tombu, chegou a Santana do Paraíba onde morreu alguns anos depois.

Conclusão

Nos séculos XVI e XVII a conquista dos territórios e populações indígenas do Guairá foi justificada em nome do “Rei” (Espanha ou Portugal) e de “Deus” (Reduções Jesuíticas). Foi ao longo desse período que os conquistadores, além de escravizar enormes contingentes de populações indígenas, passaram a veicular os elementos básicos da sua cultura através dos padres Jesuítas. No entanto, a análise das relações entre brancos e índios não pode ser dicotômica, simplesmente resumida a índios contra brancos. Deve-se considerar os grupos invasores e seus interesses localizados, bem com as etnias Guarani e os grupos Jê (Kaingang e Xokleng), que eram inimigos entre si e as alianças ocorridas entre esses grupos. Alianças explicitas ou não, pois o fato de num determinado momento um grupo indígena, que era refratário à pregação dos padres jesuítas, procurar as reduções pode ter sido apenas uma estratégia política momentânea para se livrar dos invasores paulistas ou do trabalho escravo das encomiendas espanholas. Isso revela a riqueza e a complexidade das relações sociais estabelecidas entre os sujeitos históricos que contracenaram no território do Guairá no século XVI e meados do XVII. Relações históricas estas que ainda estão por serem estudadas enriquecendo nossa compreensão sobre a ocupação de nossa região.

Francisco Silva Noelli 

Lúcio Tadeu Mota

 

Professor do Departamento de Fundamentos da Educação – UEM –  

Professor do Departamento de História – UEM

 

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