CEUs sem teatro: São Paulo precisa resistir ao desmonte da cultura

A capital paulista tem potencial para ser muito mais pujante nas artes e na cultura em geral. Não pode ser refém de dificuldades de gestão ou de orçamento

 

por Camilla Lima, Carina Vitral

 

 

A mais recente má notícia entre as tantas crueldades que vêm sendo cometidas contra a educação e a cultura do País é a da interrupção de atividades teatrais nos Centros Educacionais Unificados (CEUs), projeto de alta relevância na rede de ensino de São Paulo (SP) iniciado pela prefeita Marta Suplicy com objetivo de integrar cultura, esporte e educação para toda a comunidade de cada região onde se localizam as unidades.

 

Atualmente, são 46 CEUs espalhados em bairros da periferia paulistana com altos índices de pobreza e exclusão social. Em 2003, quando a prefeitura inaugurou o CEU Jambeiro, em Guaianases, o primeiro da rede, cada unidade fora projetada para oferecer escola (ensinos infantil e fundamental), berçário, creche, auditório, teatro, ateliê, estúdio, telecentro, biblioteca, áreas de esporte e lazer, centro comunitário, padaria e área verde. Um oásis dentro de regiões quase sem opções de atividades esportivas, artísticas e recreativas para a coletividade.

 

Hoje, lamentavelmente, verifica-se que questões administrativas se sobrepõem ao interesse da população. Conforme noticiado pelo jornal Agora São Paulo, a prefeitura alega problemas para renovar os contratos emergenciais de prestação de serviços que estavam em vigência desde 2018 e informa haver uma licitação em andamento.

 

Fato é que, no fim do ano foram encerrados contratos de técnicos de som e de luz que trabalhavam em 37 unidades. E nesta semana terminam os contratos dos profissionais das outras nove unidades, totalizando cem trabalhadores especializados, o que significa que as encenações teatrais estarão paralisadas em toda a rede de CEUs – a menos que os organizadores levem sua própria equipe técnica. Para além do prejuízo cultural em si, aumenta o número de desempregados na Capital.

 

Que triste para a maior cidade do país, que deveria ser exemplo para todo o Brasil. E que perda para aquela população cuja maioria jamais frequentou teatro ou outros espaços artísticos e tem nos Centros Educacionais a oportunidade de iniciar contato com expressões culturais que enriquecem o repertório do ser humano.

 

Infelizmente, esse episódio ocorre num momento de intensos retrocessos culturais e educacionais que se agravaram com a chegada ao poder central de fascistas, beócios, iletrados que veem nas artes, na ciência e na educação inimigos a serem eliminados. O primeiro atentado cometido por Bolsonaro foi a extinção do Ministério da Cultura, em janeiro de 2019 – e desde então uma série de ataques vem destruindo a estrutura cultural e os programas inovadores construídos nas últimas décadas por pessoas, especialmente os ministros Gilberto Gil e Juca Ferreira e suas equipes, que conhecem profundamente as raízes culturais do Brasil e as carências do nosso povo. No mais recente absurdo, um dirigente da pasta ora rebaixada a papel inexpressivo confessou-se nazista e, pior, tomou medidas para censurar a criação artística e subordiná-la a métodos e critérios obscurantistas.

 

Neste momento tão lamentável na história do País, São Paulo precisa se diferenciar do bolsonarismo. A Capital tem potencial para ser muito mais pujante nas artes e na cultura em geral. Não pode ser refém de dificuldades de gestão ou de orçamento. A cidade pode, por exemplo, espalhar Pontos de Cultura em todas as regiões, incrementar a produção cultural dos territórios, inserir os coletivos periféricos nas políticas públicas, entre tantas iniciativas que certamente têm apoio da população, que está ávida por espaços de participação e engajamento. É preciso que a prefeitura tenha ousadia e agilidade para superar os entraves e dê prioridade para ações de amplo interesse social.

 

Publicado originalmente na Mídia Ninja

 

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