Golpe é tema de série de livros

Movimento militar que derrubou João Goulart vinha sendo tramado no gabinete do presidente John Kennedy, desde 1962

Como seria fácil de prever, a efeméride dos 50 anos do Golpe de 1964 constitui ocasião para uma série de lançamentos. Não se pode usar propriamente o termo “comemoração” neste caso, mas datas redondas dão motivo a balanço e reflexão sobre eventos históricos importantes ou traumáticos. 1964 foi as duas coisas. Alguns dos lançamentos mais significativos são “1964: o Golpe”, de Flávio Tavares (L&PM), “Ditadura e Democracia no Brasil – 1964: 50 anos Depois”, de Daniel Aarão Reis (Zahar) e “Ditadura à Brasileira: 1964-1985 – a Democracia Golpeada à Esquerda e à Direita”, de Marco Antonio Villa (LeYa).
Entre os relançamentos, um destaca-se pela importância: a tetralogia “Ditadura” (Envergonhada, Escancarada, Derrotada e Encurralada), do jornalista Elio Gaspari. Não se trata de reimpressão. Doze anos após a primeira edição, Gaspari incorporou bibliografia editada no período e documentação não disponível na época. Essa reedição, da Intrínseca (a primeira foi da Cia das Letras) vem também no formato digital. Os e-books têm a vantagem de remeter a vídeos e documentos.

 

Em sua apresentação ao volume 1 de “As Ilusões Armadas – a Ditadura Envergonhada”, Gaspari nota que a atualização da obra se fazia necessária por dois motivos: a divulgação das atas de duas reuniões do Conselho de Segurança Nacional, em julho de 1968, e a evidência de que o golpe contra o governo de João Goulart já vinha sendo tramado no gabinete do presidente John Kennedy, desde 1962. Um áudio registrado em 7 de outubro de 1963, portanto 46 dias antes do seu assassinato em Dallas, mostra Kennedy como um “campeão desse projeto”. Ou seja, a derrubada do governo brasileiro.

A participação norte-americana no golpe é um dos destaques do livro de Tavares, o único que se ocupa exclusivamente da deposição de Goulart. Todos os outros – e Gaspari em quatro volumes – avançam pelo período da ditadura em suas diferentes fases e presidentes – Castello Branco, Costa e Silva, Médici, Geisel e Figueiredo. De uma primeira fase, do golpe em 1964 a 1968, quando se decreta o AI-5 e a ditadura se escancara. Das trevas de1968 até 1978, quando os atos institucionais são revogados, vem a Anistia e a transição para a democracia, que para alguns se encerra em 1985, com o primeiro governo civil, e para outros se estende até 1988, com a Assembleia Constituinte.

Por concentrada, a narrativa de Tavares é trepidante. Recria o período tenso vivido pelo País desde a renúncia de Jânio Quadros, em 1961, passando pela posse do vice, Goulart, e seu governo atribulado e esgarçado por demandas e pressões à esquerda e à direita. Tavares, na época, era colunista do jornal Última Hora e privava da intimidade de políticos e gabinetes de Brasília. Foi testemunha dos fatos, o que empresta ao seu relato caráter diferenciado.

Tavares destaca como Washington logo entrou no jogo da deposição de Jango pelo embaixador dos EUA no Brasil, Lincoln Gordon, e, mais adiante, com colaboração do seu adido militar, Vernon Walters, que deixou sua missão na Itália para conspirar contra o governo brasileiro. Detecta também a enxurrada de dólares despejada no Brasil após a reunião entre Kennedy e na Casa Branca em 1962.

O dinheiro entrava pelo Royal Bank do Canadá e não pelo Bank of America para não despertar suspeitas. De acordo com o autor, mais de 200 candidatos ao Senado, Câmara Federal e Assembleias Estaduais, considerados amigos dos EUA e inimigos dos comunistas, foram beneficiados com verba generosa.

Além disso, financiavam-se institutos como o IPÊS e o IBAD, que tinham função de propagar o receio ao “perigo vermelho” e preparar o clima do golpe. O fundamental era disseminar o medo, inclusive pelos filmes alarmistas.

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