A história do compositor, artista, protético e boêmio Assis Valente

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Felicidade afogada morreu
a esperança foi fundo e voltou
foi ao fundo e voltou
foi ao fundo e ficou

— Essa gente é tal qual passarinhos que armam e desarmam seu ninho, sem achar o lugar certo de construir…

Esse foi o ponto alto do discurso do menino Zé no Circo Brasileiro, instalado em Bonfim, interior do estado da Bahia, em 1921. Alguém da platéia ainda chegou a gritar que a frase não era dele, mas a exclamação foi abafada pelos aplausos: aquele menino estava salvando o circo de seu Francisco Salustiano. Na função da véspera, um bailarino fora vaiado e, como em cidade pequena as notícias correm depressa, o circo, desmoralizado, preparava-se para partir. Ainda assim, seu Salustiano resolvera tentar a última chance. Chamou aquele mulatinho esperto, com fama de fazer belos discursos em casamentos e batizados.

Conquistada a simpatia geral, o menino não perdeu tempo:
— Vocês querem que os artistas trabalhem ou não?

E todos quiseram. No dia seguinte, o menino era contratado. Após ter sido roubado dos pais, trabalhado como semi-escravo em casa de familia, empregado em farmácia – tudo isso até os 10 anos, o moleque José de Assis Valente preparava para dar prosseguimento a sua vida novelesca, agora engajando-se na trupe do Circo Brasileiro como orador e comediante.

Desde cedo, Assis Valente sentiu que sua vida seria cheia de lances folhetinescos. A começar pela data, cujo único dado exato é a data: 19 de março de 1911. A história do compositor, artista, protético e boêmio Assis Valente é constituída por episódios que vão do curioso ao incerto. Em suas biografias, ora se assinala o local de nascimento no Campo da Pólvora, em Salvador, ora no caminho de Bom Jardim a Patioba, em plena areia quente. E ele mesmo parecia não saber direito. Numa entrevista havia dito, em 1941:
— Sou baiano, natural do Campo da Pólvora, Salvador… Dependendo do meu humor, posso ser também de Patioba, ou Bom Jardim.

Ninguém sabe ao certo. O que se sabe é que aos seis anos de idade, a infância de aventuras começou. ‘Seqüestrado’ por um tal de Laurindo, o menino deixa os pais José de Assis Valente e Maria Esteves Valente para ser ‘criado’ pela família Canna Brasil, em Alagoinhas. Nunca mais veria os pais e nem os irmãos Paulo e Jovina.

Laurindo dizia que o menino era muito inteligente para crescer naquele meio, por isso deixou-o na mão da familia para desenvolver-se. O moleque trabalhava o dia inteiro, fazia feira aos sábados com um enorme cesto na cabeça e à noite, numa concessão especial, o garoto era obrigado à estudar.

Após receber a carta de alforria, com a ida dos pais para o Rio, empregou-se como lavador de frascos na farmácia do Hospital Santa Isabel com o salário de 300 réis por mês.

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